sexta-feira, 5 de março de 2010

Cuba e os Direitos Humanos



Depois de 50 anos de revolução e no que respeita aos Direitos Humanos, Cuba continua a não seguir os exemplos das democracias que a rodeiam e censuram, a começar pela democracia norte-americana.
Koldo Campos Sagaseta* - 05.03.10

Ao contrário de outras democracias americanas em que são comuns e constantes os motins, as mortes em massa em lutas Internas, os suicídios de presos, as mortes de detidos por falta de cuidados médicos, por desnutrição, por tortura, em Cuba há que recuar mais de 50 anos para encontrar um antecedente como o de Orlando Herrera.

E o subdesenvolvimento que Cuba apresenta em matéria penitenciária, igualmente demonstra o seu infeliz atraso no que respeita a Direitos Humanos.

É inconcebível que depois de 50 anos de revolução o governo desse país não tenha podido ver e tomar como exemplo as democracias que o rodeiam e outras da Europa que o censuram para que adopte as políticas humanitárias que lhe propõem.

Não obstante a férrea repressão, em meio século de revolução, Cuba não foi capaz de protagonizar uma só matança popular que a destaque. Ainda não conseguiu emular matanças como a de Tathelolco, no México, onde o exército mexicano despachou um milhar um milhar de estudantes, ou a de Chiapas, onde umas dezenas de ignorantes indígenas foram submetidas a mórbida obediência. Tampouco soube levar a efeito matanças civis como as protagonizadas por polícias brasileiros na favela carioca do Vigário Geral onde foram exterminados 21 povoadores em 1993 e a 400 garimpeiros na selva amazónica em 1987. Nem sequer conseguiu fazer uma matança discreta de estudantes como a executada por soldados estadunidenses no Canal do Panamá na repressão de insensatas reclamações de soberania para a zona, que foi apenas um ensaio para o eficaz bombardeamento do bairro Los Chorritos em que morreram 3 mil panamianos quando, anos mais tarde, invadiram aquele país, ou protagonizar matanças populares como as de Abril de 1984 na República Dominicana, com centenas de mortes pela cidadania às mãos do benemérito exército local em apenas alguns dias de trabalho, ou os vários «caracazos» e «bogotazos» que a história americana regista.

Cinquenta anos de revolução e Cuba ainda não conseguiu reeditar um «Cerro Maravilhas» portoriquenho, ou pôr em funcionamento modelares campos de concentração como o que têm os estadunidenses em Guantânamo, ou em outras dos seus cárceres clandestinos espalhados pelo mundo.

Cuba continua sem saber implementar como costumam na democrática Colômbia o seu exército e os seus paramilitares, o que vem a ser o mesmo, fossas comuns para enterrar milhares de camponeses, e sepultar com cal viva ou fazer desaparecer dissidentes, ao bom estilo da democracia espanhola [1].

Também Cuba não dispõe da eficácia interrogadora dos estadunidenses bem evidenciada no Iraque ou no Afeganistão, além de da carecer dos modernos métodos de interrogatório como os conhecidos por «a bolsa», o aguilhão, as sovas à vontade, as violações, e outras práticas policiais que, em qualquer caso, os juízes trataram de negar e os meios de comunicação ignoraram, dado que a denúncia da tortura, como é sabido, só corresponde a uma estratégia dissidente.

Para corrigir tão histórico atraso e sempre com o pensamento em democratizar a sua sociedade, Cuba deve proceder imediatamente: à neutralização, como na Guatemala, de quatro freiras e um bispo por cada período de tempo determinado ou incendiar uma ou outra embaixada que dê asilo a dissidentes; copiando os exemplos salvadorenhos, de vez em quando deve repreender em plena eucaristia um cardeal [1] e para aí uns cinco jesuítas; a reformar milhares de sindicalistas como na Colômbia, que converteu essa actividade na principal causa de morte entre os trabalhadores; a retirar da circulação os opositores mais recalcitrantes, com a discrição e a impunidade com que o faz, por exemplo, o actual governo hondurenho; a disparar contra jornalistas com a precisão e o alcance dos marines norte-americanos em todas as partes do mundo, ou a reprimir nas ruas com a devida contundência qualquer manifestação popular, tal como vemos e apreciamos nas irrepreensíveis democracias americanas e europeias.

Cuba também deve neutralizar estudantes pérfidos e professores cúmplices como na democracia peruana e eliminar perigosos comunicadores como o fez a democracia argentina com as pessoas de Bonino e Cabezas, o gioverno peruano nos Andes de esse país, o Estado mexicano e o colombiano a todo o pé de passada, o como ocorreu na República Dominicana com Orlando Martinez, Goyito e Narcisazo.

Cuba deve aprender a rebentar os opositores ao regime, como fez a democrática polícia de Pinochet e a própria CIA nos ilustrou com o assassínio de Letelier [3] e da sua secretária a um par de quarteirões da Casa Branca. Cuba deve aprender a fazer desaparecer não só as queixas dos inconformados dissidentes mas também os próprios dissidentes, tendo em consideração as sábias experiências das democracias militares da Argentina, do Chile e do Uruguai e as suas operações Condor, que no mar nunca vão descobrir-se inconvenientes fossas comuns; a seguir deve proceder a fortes matanças de negros, como na democracia estadunidense nos anos sessenta ou, mais recentemente, em Los Angeles depois das desordens ocorridas a seguir ao democrático espancamento de um suposto cidadão negro.

E para melhor iniciar estas reformas, Cuba deve mandar pelos ares um ou outro avião de passageiros, tal e como fizeram milicianos anticastristas e agentes da CIA, como Posada Carriles e Orlando Bosch [4].

Cuba ainda nem sequer foi capaz, apesar do tempo decorrido, de aprender a cometer erros como o que recentemente a CIA reconheceu ao mandar derrubar um avião carregado de missionários estadunidenses a quem confundiram com narcotraficantes, ou como os tantos e tão sangrentos erros que nas suas guerras humanitárias desencadeiam as forças da paz da NATO e os Estados Unidos nos países que ocupam.

E estes não são as únicas mudanças que Cuba deve enfrentar.

Em matéria de educação deve proceder imediatamente a uma massiva campanha de animalização que devolva o povo cubano à feliz ignorância em que vivia antes da revolução; deve erradicar das escolas costumes tão obscenos e perniciosos como a do fornecimento do pequeno-almoço escolar, substituindo o leite e o pão por cimento e gasolina; deve estimular nos seus estudantes condutas cívicas e democráticas como as que se dão nos Estados Unidos para que os alunos da pré-primária e primária protagonizem matanças escolares dignas de encómio. Tal atraso poderia contrariar-se submetendo os estudantes cubanos a permanentes sessões de cinema e televisão genuinamente «americanas» que substituam os caducos e tresloucados princípios da educação cubana pelos competitivos e cristãos valores estadunidenses.

Cuba também deve estabelecer um encerramento massivo de escolas e institutos para que a sua infância possa deambular nua e descalça pelas ruas do país, apanhando garrafas e dedicando-se a outras actividades sãs e mercantis que a ajudem a compreender as características da sociedade a que Cuba tem necessidade de assemelhar-se.

Ocasionalmente, como ocorre noutras democracias latino-americanas a que Cuba deve abrir-se, tal e como pediu sua santidade João Paulo II, procedendo a uma ordenada e meticulosa neutralização dos excedentes infantis nas ruas do país, para o que polícia cubana deveria procurar ser assessorada por peritos comandantes das polícias da Colômbia, Guatemala e Brasil.

Em relação à saúde, Cuba deve suprimir o seu ineficaz sistema de hospitais públicos e laboratórios, criando modernos consultórios de curandeiros. Nos centros médicos que não possam ser reconvertidos deverá ser imposto o pagamento obrigatório, como garantia prévia ao internamento do doente, incluindo aqui as urgências. Os que não estejam em condições de suportar os custos poderão sempre ser democraticamente mandados para a rua. Nas maternidades, como acontece em democracias vizinhas de Cuba, cada cama deve ser ocupada por duas ou três parturientes para que possam partilhar tão bela experiência, ajudar-se na contagem das dilatações e juntas fazerem força. A injusta distribuição dos rebentos será substituída pela permuta de bebés e os sequestros de recém-nascidos, à semelhança do que acontece nos países vizinhos. Imediatamente, Cuba deve igualmente proceder ao encerramento do Hospital Pediátrico de Tarará, a 20 quilómetros de Havana, onde o Estado cubano tem vindo a tratar grátis, até hoje, 25.000 meninos e meninas de Chernobyl e outros países do terceiro mundo, para, então, pode dedicar esse despautério aos investimentos em Bolsa. Pela mesma razão deve ser encerrada a Universidade Internacional de Medicina, onde milhares de estudantes latino-americanos sem recursos estudam para essa carreira e dedicar esses bens e terrenos á construção de campos de golfe.

No que respeita ao desporto, Cuba deve proibir, definitivamente, costumes tão insensatos como correr, saltar e outras impudicas semelhantes, bem como fechar estádios e campos de desporto para inaugurar em seu lugar casinos, hipódromos e galleras [5], bancas de apostas e lotarias, rifas diplomáticas e outras lúdicas recreações.

No campo cultural Cuba deve fechar todas as absurdas escolas de cinema, de teatro, de dança e de outras denegridas actividades para a condição humana, fomentando em seu lugar «música pimba» tão do agrado dos turistas como «el perrito», «el pollito» e «el maco-penpén». Também deverão promover espectáculos como os «t-shirt molhada» e toda a espécie de nus, naturalmente artísticos.

Na habitação Cuba deve esmerar-se na construção de modernos condomínios ao estilo das democracias próximas e que em sua honra se chamarão o Pântano, o Buraco de Chulín, Vietname, Camboja, os Cartões e a Cucaracha, todos dotados das correspondentes águas negras e aromáticas pestilências

Quanto ao trabalho Cuba deve diversificar as suas políticas de emprego para melhor encarar a presente crise com novos ofícios e profissões como: limpa-vidros, mergulhadores, do que houver [chiripero], vendedores de lotaria, vendedores de cachorros quentes e outros ofícios idênticos.

Do mesmo modo, os anacrónicos monumentos a Che, a Máximo Gomes, ou a Marti devem ser substituídos por monumentais faróis em homenagem ao nobre corsário Drake, e estátuas de empresários como Al Capone ou de santidades como Escrivá de Balaguer.

É uma lástima que Cuba, não obstante o clamor dos meios de comunicação do mundo livre para que se converta numa outra democracia como as descritas, se empenhe em continuar a ser diferente.
Notas do Tradutor:


[1] O autor refere-se aos GAL, um autêntico esquadrão da morte, criado em Espanha no tempo do governo do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE) liderado por Filipe Gonzalez.

[2] Cardeal Romero que foi assassinado em plena missa, há cerca de 30 anos, sem que o Vaticano tenha feito os protestos adequados à gravidade do acto.

[3] Orlando Letelier foi ministro dos Negócios Estrangeiros do governo de Salvador Allende

[4] Dois terroristas confessos responsáveis por muitas mortes, vivem livremente nos EUA com acesso a verbas governamentais, que lhes garantiu e aumenta as grandes fortunas que possuem. Vários países da América Latina pedem a sua extradição para serem julgados por crimes de morte praticados nesses países, mas os EUA protegem-nos e não os extraditam.

[5] Locais apropriados para luta de galos

* Escritor e jornalista basco

Publicado por Odio de Clase: http://odiodeclase.blogspot.com/2010/03/las-carencias-de-cuba-en-derechos.html

Tradução de José Paulo Gascão

1 comentário:

Fernando Samuel disse...

Excelente texto.

VIVA CUBA!


Um abraço.

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