O Estatuto Alcavalatório
- Manuel Gouveia
Continuar, significa que não devemos estagnar no pouco tempo que temos de estar neste pequeno mundo dentro do grande Universo que nos rodeia. Continuar, é lutar contra a exploração do homem pelo homem é combater as injustiças que nos rodeiam neste Mundo. Continuar, é o estar sempre presente, olhando o futuro não esquecendo o passado.
No programa Negócios da Semana de 6.ª feira passada, a SIC-Notícias entrevistou Alexandre Soares Santos, presidente do Conselho de Administração do grupo Jerónimo Martins. O motivo imediato foi a abertura do milésimo supermercado Biedronka, na Polónia, naquele que é considerado um dos maiores investimentos de capital português no estrangeiro. Por cá, a Jerónimo Martins é conhecida por ser proprietária das cadeias Pingo Doce, Feira Nova e Recheio, além de significativas participações noutros grupos e investimentos. Além de, claro, ter voltado a bater recordes nos lucros de 2008.
Em pouco mais de 45 minutos de entrevista, Soares Santos pronuncia-se sobre tudo – do Estado à agricultura, defendendo o «direito ao trabalho» em vez do «direito ao emprego», entre outras pérolas.
Mas é sobre «a política» que Soares Santos mais se solta e brilha: espera que das próximas eleições legislativas saia uma maioria absoluta «seja de quem for. Só espero que não seja da esquerda. A partir do PS, perfeitamente.» Diz-se incomodado com a «esquerda retrógada», que quer impor por cá os «regimes que caíram no Leste»: «ainda no outro dia ouvi um político a falar do capital como se fossem uns malandros que tudo estragam e nada estão a fazer. Esquecem-se que 25 de Abril houve um, não dois. A iniciativa privada não tem de aturar isto e, se assim for, passem muito bem que nós temos para onde ir». E acrescenta que o que faz falta é «criar na iniciativa privada a confiança que foi perdida com o 25 de Abril» e reconquistada com o primeiro governo de Mário Soares.
Diz o nosso povo que a verdade é como o azeite, por vir sempre ao de cima. Mas tanta sinceridade até espanta e dá vontade de gravar a entrevista para explicar melhor aos incrédulos três coisinhas muito importantes: até que ponto se identificam os objectivos do PS com os dos grandes grupos económicos; o quanto foram profundas as conquistas de Abril para, 35 anos depois, esta gente ainda andar a recuperar; e que é do PCP que têm medo – da sua firme opção de classe, do seu enraizamento, da luta de massas, da determinação em romper com a política de direita.
Alívio deles, desespero nosso
O início da semana ficou marcado pelo anúncio do aumento brutal do desemprego: em Janeiro inscreveram-se nos centros de emprego 70 334 trabalhadores, mais 44,7 por cento do que em Dezembro último e mais 27,3 por cento quando comparado com o período homólogo do ano passado. Os dados, divulgados esta segunda-feira, 23, pelo Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) devem ter arrefecido o entusiasmo manifestado pelo Governo a semana passada, quando alguns ministros com apurada falta de senso chegaram publicamente a suspirar de alívio por a taxa média de desemprego registada em 2008, segundo o Instituto Nacional de Estatística, ser «apenas» de 7,6 por cento, quando em 2007 havia sido de oito por cento.
Como se menos quatro décimas fossem a prenda do bolo-rei da excelência das medidas do executivo e não a fava amarga com que ciclicamente se transveste a precariedade no emprego tão tenazmente promovida pelo Governo Sócrates.
Como se efectivamente o desemprego estivesse a ser combatido e não escondido para debaixo do tapete das acções de formação e outros expedientes useiros e vezeiros para esconder o sol com a peneira enquanto se vão peneirando números para a estatística.Se é escandaloso, para não dizer mesmo obsceno, que numa altura em que centenas de milhares de portugueses se debatem sem trabalho e muitos mais têm a vida a prazo os ministros de serviço venham dourar a pílula fazendo crer que a desgraça afinal não é assim tão grande, que dizer então da demagogia eleitoralista reinante no PS na corrida para nova maioria absoluta quando todos os dias a realidade nua e crua mostra um País a afundar-se no abismo graças à sua governação?
Basta atentar nas declarações do presidente do IEFP para se perceber que estes dados não são uma surpresa, pois segundo Francisco Madelino o desemprego vem aumentando desde de Setembro do ano passado. Sem poder invocar desconhecimento, o alívio do Governo só pode ser entendido como uma ofensa ao povo português.