segunda-feira, 17 de novembro de 2008

O mundo ao contrário?


Neste texto, depois de denunciar a deriva irresponsável do Governo PS de José Sócrates na sua ânsia de satisfazer os interesses do grande capital a quem se entregou, Bernardino Soares conclui: “Quando um punhado de privilegiados continua a acumular a riqueza, enquanto o povo vê a sua vida cada vez mais difícil, mundo está de facto ao contrário. É preciso transformá-lo!”


Para um observador desprevenido que olhasse para o que acontece em Portugal e no mundo, a sensação seria a de que estava perante um mundo ao contrário.

Os governos capitalistas intervêm em grandes empresas, chegando a nacionalizá-las, enquanto os senhores do capital advogam a importância do Estado.

Estranho!

Em Portugal, Sócrates e o Governo PS esconjuram o «Estado mínimo» e renegam o neoliberalismo, proclamando a sua morte, sempre acrescentando que uma outra opção – o socialismo – continua morta, não vá o diabo tecê-las. Nacionalizam um banco aparentemente contra a vontade dos accionistas e com a oposição... do PCP.

Estranho!

Na realidade, comprova-se a subordinação do Estado aos interesses do grande capital. Se isso é verdade em períodos de menor instabilidade, sem prejuízo dos direitos sociais que os trabalhadores e os povos foram conquistando, especialmente enquanto existiu o contraponto do campo socialista, mais se confirma nas crises cíclicas do capitalismo.

Sócrates ataca a direita acusando-a de tudo querer privatizar. Mas o Governo PS propõe-se arrecadar 1200 milhões de euros em privatizações no próximo ano, incluindo o que resta da participação do Estado na GALP, mais a ANA, a TAP e a REN, entre outras empresas.

No fundamental, são empresas lucrativas e para além disso estratégicas para a economia e a soberania nacionais. Perante isto, afirmam que o Estado não deve sair da área social, mas na realidade os privados gerem cada vez mais áreas na Saúde, na Educação, e até no Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, o Governo entregou à especulação bolsista mais de 20% do capital, registando já perdas de pelo menos 200 milhões de euros.

Enquanto isto, o Governo entrega milhões aos bancos. 20 mil milhões de euros de avales para lhes garantir melhores condições de financiamento, 4 mil milhões directamente para os capitais próprios e a criação de fundos imobiliários para limpar os créditos de risco ou em incumprimento, com isenção total de todos os impostos. E, finalmente, a «nacionalização» do BPN.

A favor dos mais poderosos

Durante meses ou até anos, o Banco de Portugal e o Governo, conhecedores da grave situação da instituição, do seu desequilíbrio e envolvimento em operações fraudulentas, não actuaram.

O Governo justifica agora a nacionalização do BPN como única forma de garantir os depósitos e prevenir efeitos de contágio noutras instituições bancárias, bem como de defender os postos de trabalho.

Na verdade, trata-se da socialização dos prejuízos acumulados pelo BPN, que aliás começou com a injecção nos últimos meses de 435 milhões de euros pela Caixa Geral de Depósitos (CGD) e pelo Banco de Portugal, mais o depósito em Agosto de 500 milhões de euros pela Segurança Social.

Os dados disponíveis apontam, certamente por defeito, para um rombo financeiro de pelo menos 700 milhões de euros, sendo previsível que haja subavaliação do passivo e sobreavaliação dos activos. Isso não impediu que o grupo onde se integra o BPN tenha em 2007, com lucros de 56 milhões de euros (reais ou ficcionados), distribuído quase 30 milhões de euros de dividentos pelos accionistas (estes bem reais).

Apesar disto, o Governo decidiu restringir a privatização ao Banco em sentido mais restrito (BPN S.A.), deixando de fora o resto do grupo Sociedade Lusa de Negócios (SLN), e o BPN S.G.P.S., com importantes activos, incluindo a maior parte da área seguradora. Para além disso, os postos de trabalho são cerca de 1.700 na parte nacionalizada e mais de 6.500 no total do grupo o que denuncia a hipocrisia do argumento da defesa dos postos de trabalho. Lembre-se ainda que o Governo já garantiu em geral os depósitos até 100 mil euros em todas as instituições bancárias, pelo que não é isso que determina esta intervenção.

O que isto significa é que o Governo deixou aos accionistas do grupo SLN, no fundamental os mesmos do nacionalizado BPN, a parte mais sã e assumiu para o Estado a parte podre. Significa ainda que o Estado terá de injectar os recursos em falta, que vai tirar ao Orçamento do Estado ou à CGD, para depois provavelmente privatizar, em bloco ou em parcelas.

Prevê-se ainda a indemnização dos accionistas, mesmo dos que sejam condenados por fraude ou má gestão. Para o Governo, aqueles que são responsáveis pela descapitalização do Banco, que leva à intervenção do Estado, devem ser indemnizados. E se sofrerem sanções pecuniárias, a indemnização servirá para as pagar no todo ou em parte.

Comprova-se assim que esta operação tem tanto de nacionalização quanto tem de socialista a política do Governo PS... Quando um punhado de privilegiados continua a acumular a riqueza, enquanto o povo vê a sua vida cada vez mais difícil, mundo está de facto ao contrário. É preciso transformá-lo!

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