terça-feira, 1 de dezembro de 2009

AS ILEGAIS ELEIÇÕES NAS HONDURAS



E A HIPOCRISIA DE WASHINGTON



A Resistência Nacional diz que a abstenção foi 65 a 70% e os golpistas dizem que os votantes foram cerca de 65%, numas eleições em que não houve observadores internacionais…

Eva Golinger* - 01.12.09



O que é que havemos de fazer, ficarmos sentados durante quatro anos e simplesmente condenar o golpe? – declarações de um alto funcionário do Departamento de Estado de Washington ontem [dia 28 de Novembro].

As verdadeiras divisões na América Latina – entre a justiça e a injustiça, a democracia e a ditadura, direitos humanos e direitos das transnacionais, poder popular e dominação imperial – nunca foram tão visíveis como hoje. Os movimentos dos povos em toda a região para transformar sistemas corruptos e desiguais que isolaram e excluíram a maioria das nações latino-americanas estão hoje a tomar o poder de forma democrática e a construir novos modelos baseados na justiça económica e social. A Venezuela, Bolívia, Nicarágua e Equador estão na vanguarda desses movimentos, enquanto outras nações como o Uruguai e a Argentina estão a movimentar-se para a mudança, embora num passo um pouco mais lento.

Historicamente, a região esteve pejada de uma brutal ingerência dos Estados Unidos, que procurou a todo o custo dominar e controlar os recursos estratégicos e naturais de território de abundância. Com excepção de desafiadora revolução cubana, Washington conseguiu instalar regimes títeres por toda a América Latina no final do século XX. Quando Hugo Chávez ganhou a presidência em 1998 e a revolução bolivariana começou a florescer, o balanço do poder e o controlo imperial sobre a região debilitam-se. Oito anos de governo de George W. Bush trouxeram novamente os golpes de Estado à região, na Venezuela em 2002 contra o Presidente Chávez e no Haiti em 2004 contra o Presidente Aristide. O primeiro golpe foi derrotado por uma insurreição popular massiva do povo, e o segundo conseguiu sequestrar e derrotar o presidente que já não interessava aos interesses de Washington.

Apesar dos esforços da administração de Bush para neutralizar a expansão da revolução na América Latina por meio de golpes, sabotagens económicas, guerra mediática, operações psicológicas, intervenção eleitoral e um incremento da presença militar, nações como as Honduras, S. salvador e Guatemala elegeram presidentes de tendência de esquerda. A integração latino-americana consolidou-se com a UNASUR e ALBA, e as garras do poder de Washington começaram a desaparecer.

Henry Kissinger disse nos anos setenta: «se não podemos controlar a América Latina, como vamos dominar o mundo»? Esta visão imperialista tem hoje toda a actualidade. A presença de Obama na Casa Branca foi vista de forma errónea por muitos da região como o sinal de um fim da agressão estadunidense no mundo e especialmente aqui, na América Latina. Pelo menos muitos pensavam que Obama diminuiria as crescentes tensões com os seus vizinhos do Sul. E o novo presidente dos Estados Unidos, ele próprio, fez alusões a tais mudanças.

Mas agora, a estratégia do «Smart Power» (poder inteligente) da administração de Obama foi desmascarada. Os abraços, troca de apertos de mão, sorrisos, ofertas e promessas de «não mais intervenção» e «uma nova era» realizadas pelo próprio Presidente Obamaperante os líderes das nações latino-americanas durante a Cimeira das Américas em Trinidad em Abri passado, converteu-se em cínico gestos de hipocresia. Quando Obama chegou ao poder, a reputação de Washington estava em queda. As débeis tentativas de «mudar» a relação Norte-Sul nas Américas desembocou numa situação pior., reafirmando que a visão de Kissinger sobre a importância de controlar esta região é uma política de estado de Washington, que não depende de nenhum partido ou chefe de Estado.

O papel de Washington no golpe das Honduras contra o Presidente Zelaya foi evidente desde o primeiro dia. O financiamento aos golpistas continua, a presença militar do Pentágono em Soto Cano, as constantes reuniões entre funcionários do Departamento de Estado e o embaixador dos EUA nas Honduras, Hugo Llorens, com os golpistas, e as cínicas tentativas de forçar uma «mediação» e «negociação» entre golpistas e o governo legítimo das Honduras são evidências irrefutáveis das intenções de Washington de consolidar esta nova forma de «golpe inteligente». A insistência inicial do governo Obama sobre a legitimidade de Zelaya como presidente das Honduras rapidamente desapareceu, passadas que foram as primeiras semanas após o golpe. Os apelos à «restituição da ordem democrática e constitucional» nas Honduras foram débeis cochichos repetidos pelas vozes monótonas dos porta-vozes do Departamento de Estado.
 
A imposição do presidente da Costa Rica, Óscar Árias – um peão de Washington – para «mediar» a «negociação» ordenada por Washington entre golpistas e o presidente Zelaya foi um acto circense. Desde o primeiro momento era óbvio que o Departamento de Estado estava a promover uma estratégia de «ganhar tempo» para consolidar o golpe nas Honduras. A falta de sinceridade de Árias e a sua cumplicidade no golpe foi evidente desde a manhã do violento sequestro e exílio forçado de Zelaya. Altos funcionários do Pentágono, do Departamento de Estado e da CIA presentes na base de Soto Cano, controlada por Washington, arranjaram o transporte de Zelaya à Costa Rica. Árias já tinha expresso de forma servil a sua disposição de dar refúgio ao presidente ilegalmente exilado e de não deter os sequestradores que pilotaram o avião que – violando o direito internacional – chegou ao território da Costa Rica.

Hoje, Óscar Árias fez um apelo a todas as nações do mundo para «reconhecerem» as ilegais e ilegítimas eleições que têm hoje [dia 29 de Novemro] lugar nas Honduras. Por que não?, disse Árias, se não há fraude ou irregularidades, por que não reconhecer um novo presidente? O Departamento de Estado e até o próprio presidente Obama disseram o mesmo e estão a apelar – pressionando – aos seus aliados para que reconheçam o novo regime das Honduras, eleito sob uma ditadura. A fraude e as irregularidades já estão presentes, considerando que hoje não existe qualquer democracia nas Honduras que permita as adequadas condições para um processo eleitoral. E o Departamento de Estado admitiu há duas semanas que estão há muito tempo a financiar activamente o processo eleitoral e as campanhas eleitorais nas Honduras. E os «observadores internacionais» enviados para dar credibilidade ao ilegal processo das Honduras são, todos eles, agências e agentes do império. O Instituto Republicano Internacional (IRI) e o Instituto Democrata Nacional (NDI), duas agências criadas para levar o financiamento da USAID e da NED a partidos políticos no exterior e promover a agenda estadunidense, não apenas financiaram os grupos envolvidos no golpe de Estado das Honduras como estão agora a «observar» as eleições. Grupos terroristas como UnoAmérica, dirigido pelo golpista venezuelano Alejandro Peña Esclusa, também enviou «observadores» às Honduras. E o criminoso terrorista cubano-americano (Miami) Adolfo Franco, antigo director da USAID é outro «peso-pesado» na lista de observadores eleitorais hoje [ontem] nas Honduras.

Mas a Organização dos Estados Americanos (OEA) e o Centro Carter, que não são estruturas de esquerda, condenaram o processo eleitoral das Honduras como ilegítimo e recusaram enviar observadores, O mesmo fizeram as Nações Unidas e a União Europeia, tal como a UNASUR e a ALBA.

Washington está só, apoiado pelos seus regimes títeres da Colômbia, Panamá, Peru, Costa Rica e Israel, únicas nações que publicamente afirmaram o seu reconhecimento do processo eleitoral das Honduras. Um alto funcionário do Departamento de Estado declarou ontem [dia 28 de Novembro] ao Washington Post: «o que é que havemos de fazer, ficarmos sentados durante quatro anos e simplesmente condenar o golpe»? Mas o governo de Washington ficou durante 50 anos sentado recusando reconhecer o governo cubano. Mas isso é porque o governo de Cuba não convém a Washington. E o regime ditatorial das Honduras convém, esse sim, convém-lhe.

O movimento de resistência nas Honduras está a boicotar as eleições, apelando à abstenção massiva do ilegal processo. As ruas das Honduras foram ocupadas por milhares de militares sob o controlo do Pentágono. Com armas cedidas por Israel, o regime golpista está preparado para reprimir e brutalizar de forma maciça os que resistem ao processo eleitoral. Devemos manter a nossa vigilância e solidariedade com o povo das Honduras face ao imenso perigo que o cerca. As eleições de hoje nas Honduras constituem um segundo golpe de Estado contra o povo hondurenho, desta vez abertamente concebido, promovido e apoiado por Washington. Independentemente do resultado das eleições não haverá justiça nas Honduras até que cesse a ingerência imperial.


  • Eva Golinger é advogada e escritora norte-americana de origem venezuelana.
Tradução de José Paulo Gascão





Delírio fatal

O País está a viver tempos conturbados e estou em crer que o facto nada tem a ver com a famigerada «crise», a gripe A, o resultado das eleições ou mesmo o aquecimento global com que o senhor Al Gore anda alegremente a alengordar as suas posses. A avaliar pela dimensão do fenómeno a coisa tem de ser muito mais grave, com eventuais ligações aos mundos do outro mundo, já que nada, mas nada do que cá por este lado se vive e respira pode explicar tamanha sandice. Repare-se nos sintomas: das obscuras conversas de café às reuniões de Estado, passando obviamente pela vasta panóplia de comentadores com que o País se inebria para ter a ilusão de nada escapar à perspicácia da «opinião pública», o quotidiano nacional enveredou por um caminho que mete num chinelo o mais sofisticado palácio da loucura.


Ele são decapitações políticas, assassinatos políticos, assassínios de carácter, homicídios de carácter.


Ele é o Governo a nomear os candidatos derrotados às câmaras (casos de Gondomar, Espinho, Viseu e Alpiarça) como governadores civis dos respectivos distritos.


Ele é, sobretudo, o inenarrável romance das «escutas» do primeiro-ministro que não eram ao primeiro-ministro; do procurador-geral que divulgava as escutas para «acalmar isto» mas não divulga; do corropio das certidões entre a Procuradoria-Geral da República (PGR) e o Supremo Tribunal de Justiça (STJ); do manda destruir mas não destrói, porque afinal parece que não se pode, as ditas certidões das ditas escutas; do manda arquivar as ditas cujas mas sem direito a consulta, por causa – palavras da PGR – da «natureza dos elementos»; do afinal não se pode consultar o que arquivado já estaria mas que pelos vistos já não está porque estará agora de novo «em poder do senhor presidente» do STJ; do diz que diz que disse mas não disse e tudo o que se disse é (ou pode vir a ser) mentira...


Ufff. Convenhamos que é muita areia para qualquer camioneta, como dizia a minha avó, mesmo num país de brandos costumes como os nossos onde só de quando em vez se atiram bispos pela janela. Isto mais parece um enredo de filme da série B sobre as graças e desgraças de um «serial killer» lusitano, enxertado (o enredo) na peça «A cantora Careca» de Eugene Ionesco na mais pura tradição do teatro dito do absurdo, e retocado aqui e ali com umas pincelados do «Visconde Cortado ao Meio» de Italo Calvino, com as metades do visconde Medardo de Terralba (protagonista da obra) a pregar cada uma para seu lado. E isto sem falar – justo é que se diga – no facto de as prestações dos protagonistas nacionais – todos atacados por uma atracção fatal pelos holofotes das câmaras de televisão, dos microfones da rádio, das máquinas fotográfica e até das esferográficas dos repórteres de serviço sem paralelo no mundo animal – baterem aos pontos as mais delirantes criações dos génios da literatura.


Só pode ser uma maldição. Uma praga. Um ataque alienígena. Uma calamidade. Cá por mim mandava vir um exorcista. Ou ainda acabamos todos convencidos, como o Aleixo, que «uma mosca sem valor, pousa co'a mesma alegria, na careca de um doutor (ou engenheiro), como em qualquer porcaria».

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