sexta-feira, 30 de abril de 2010

CHEIROS DE MAIO
Nos 120 anos de Maio e 40 anos da CGTP-IN



Lutar para mudar

Os 120 anos da celebração do Dia Internacional dos Trabalhadores - a que dedicamos este caderno do Avante! - marcam as quase quatro dezenas de manifestações de rua, num total de quase uma centena de iniciativas, que a CGTP-IN leva a cabo em todos os distritos e nas regiões autónomas, sob o lema «É Tempo de Mudar, Com a Luta de Quem Trabalha». Este ano festeja-se ainda o 40.º aniversário da fundação da Intersindical, a 1 de Outubro.
 
«É preciso lutar para mudar», apela a Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses - Intersindical Nacional, no manifesto distribuído nos últimos dias, em empresas e nas ruas. Ocorrendo as comemorações do 1.º de Maio «num quadro de grandes dificuldades para a grande maioria dos trabalhadores portugueses», a Inter avisa, mais uma vez, que «é preciso dizer não às políticas que o Governo Sócrates, com o apoio expresso ou implícito dos partidos de direita e também do Presidente da República, se propõe aplicar» e que «vão no sentido de reforçar as mesmas orientações e medidas que conduziram ao debilitamento da estrutura produtiva, ao aumento do desemprego e ao acentuar das clivagens e desigualdades sociais».

Em causa, muito concretamente, está o PEC do Governo, um plano que se apresenta como sendo «de estabilidade e crescimento», mas que, como a CGTP-IN alerta, «representa quatro grandes perigos, que é necessário afastar: o agravamento da situação económica; a desarticulação de serviços do Estado; o aumento das desigualdades; e a acentuação do endividamento do País».

A central reafirma que «há alternativas» e que «a luta dos trabalhadores é imperiosa para mudar o rumo do País, para travar uma situação de declínio económico e uma crise social ainda mais grave».

Do vasto rol de propostas e reivindicações que o movimento sindical unitário tem apresentado ao Governo e ao patronato, são destacados quatro pontos no manifesto deste 1.º de Maio: a criação de emprego e o devido apoio aos desempregados; o ataque à precariedade de emprego; o combate às desigualdades e à pobreza; e o aumento dos salários de todos os trabalhadores.

O aumento dos salários é apontado como «justo e inadiável», destacando a CGTP que: um terço dos trabalhadores ganha menos de 500 euros; o nível de vida caiu, de 78 por cento da média europeia, em 2000, para 76 por cento, em 2008; em sete anos, o leque salarial alargou-se (de 4,4 para 6,1), favorecendo quem mais ganha; os grupos económicos e financeiros continuam a acumular lucros; os gestores são dos mais bem pagos da Europa.

A central valoriza o contributo das lutas dos trabalhadores, ao longo dos anos, para que fossem alcançadas «significativas conquistas nas relações de trabalho», referindo algumas cuja consolidação e evolução no sentido do progresso social se exige na luta do dia-a-dia, designadamente os direitos «ao emprego com direitos, a um salário digno, a um horário que assegure a conciliação da vida profissional com a familiar, a condições de segurança, higiene e saúde no trabalho, ao respeito pelos contratos colectivos e pelas leis que fundamentam a matriz da acção sindical dos trabalhadores portugueses».

Estes objectivos, com diferente peso relativo nos diversos sectores e empresas, têm marcado as lutas desenvolvidas nos últimos meses. As acções do Dia do Trabalhador serão ponto de convergência dos protestos que se fizeram ouvir por todo o País, em greves e concentrações, em manifestações distritais e sectoriais, na manifestação nacional da juventude trabalhadora, há um mês. Mas, como a central tem adiantado, o 1.º de Maio apontará também caminhos para elevar as lutas a novos patamares, até que se alcance a necessária mudança.

 
Todos ao 1.º de Maio!

Lisboa: 14.30 horas, do Martim Moniz para a Alameda D. Afonso Henriques

Porto: 15 horas, Avenida dos Aliados

Aveiro: 15 horas, do Largo da Estação para o Largo do Rossio

Beja: 11 horas, da USB/CGTP-IN até ao Parque de Merendas; também nas barragens do Roxo e do Enxoé

Braga: 16 horas, no Largo do Toural, em Guimarães

Bragança: a partir das 10 horas, na Praça Cavaleiro Ferreira (Bragança) e na Praça Francisco Meireles, em Torre de Moncorvo

Castelo Branco: 14 horas, no Centro Cívico (Docas), em Castelo Branco; 15.30 horas, junto ao Pelourinho, na Covilhã; também na Panasqueira, em Unhais da Serra e Tortosendo

Coimbra: 14.30 horas, da Praça da República para a Praça 8 de Maio, em Coimbra; 15 horas, no Jardim Municipal da Figueira da Foz

Évora: 12 horas, da Praça do Giraldo para o Jardim Público; também em Montemor-o-Novo, Vendas Novas e Vila Viçosa;

Faro: 16 horas, na Alameda

Guarda: 15 horas, Parque Rio Diz; também em Gouveia e São Romão

Leiria: 15 horas, do Largo Santo Agostinho para a Praça Rodrigues Lobo

Lisboa: Torres Vedras, a partir das 10 horas, no Choupal

Portalegre: 11 horas, da Av. da Liberdade para a Praça da República

Santarém: 15 horas, Largo Cândido dos Reis

Setúbal (concelhos de Palmela e Setúbal): 14 horas, do Jardim do Quebedo para a Av. Luísa Todi; também em Grândola, Sines, Santiago do Cacém (Rio da Figueira) e Alcácer do Sal (barragens do Pego do Altar, do Vale do Gaio e da Azenha)

Viana do Castelo: 15.30 horas, na Praça da República

Vila Real: 15 horas, Largo da Capela Nova, também em Chaves e Peso da Régua

Viseu: 14.30 horas, no Rossio; também em Lamego e Mangualde

RA Açores: em Angra do Heroísmo, Horta e Ponta Delgada (Ribeira Grande)

RA Madeira: 17.30 horas, no Jardim Municipal, com ida até à Assembleia Legislativa Regional



quinta-feira, 22 de abril de 2010

CHEIROS DE ABRIL
Baixos salários – para «resolver a crise»?

A ministra do Trabalho atabalhoou esta semana uma «explicação» para controverter a denúncia da CGTP quanto à duplicação nos últimos 4 anos do número de trabalhadores ganhando apenas o salário mínimo. Nada mais natural – disse a ministra: Portugal sempre seguiu como estratégia uma política de baixos salários; é natural que em época de crise isso aumente... A CGTP bem explicou que a política de abaixamento dos salários e despedimentos em massa (ainda recentemente defendida pelo ministro da Economia) é, precisamente, uma das causas do agravamento da crise.


É arrepiante ouvir ministros deste género na semana em que comemoramos o 25 de Abril. Isso só comprova como o capital financeiro retomou o controlo da economia e, por via eleitoral, se apossou do aparelho de Estado, utilizado-o para desenvolver o processo contra-revolucionário. Esta subversão tem tido a sua concretização pontual em leis como o novo código laboral e a ofensiva contra os direitos sociais e os serviços públicos.

Sob a capa do exercício formal das instituições democráticas tem avançado assim uma espécie de golpe de Estado silencioso, insidioso, para estabelecer como facto consumado uma mudança de regime.

As lutas que têm marcado a agenda política comprovam que no plano social existe potencialmente apoio para uma ruptura desta política reaccionária e para uma alternativa democrática.

Mas o que mais tem dificultado e impedido essa ruptura é a prática seguida pelo PS, que proclamando-se como «esquerda moderna» pratica uma política de regresso às leis do passado.

A indefinição da distinção entre esquerda e direita desarma e descaracteriza a esquerda, ocultando o que é histórica e politicamente a direita, com a sua secular luta contra a democracia e as expressões sociais da democracia. A caracterização da esquerda tornou-se, pois, uma das questões políticas e ideológicas mais importantes do nosso tempo. Iniciativas que não clarifiquem estas questões só podem levar ao descrédito da esquerda perante as massas populares e, portanto, dar trunfos à direita.

É uma questão que está na ordem do dia neste aniversário do 25 de Abril.

  • Aurélio Santos

domingo, 18 de abril de 2010

CHEIROS DE ABRIL
Conversa fiada

O presidente executivo da Galp Energia, Ferreira de Oliveira, acusa os trabalhadores de estarem a «sacrificar» os resultados da empresa para 2010. Motivo: o pré-aviso de greve às horas extraordinárias nos próximos dias 17 e 18 e de greve total de 19 a 22 de Abril, em luta pela a actualização salarial e pela atribuição do Prémio de Produtividade.

A acusação consta de uma missiva aos «estimados colegas e colaboradores», enviada por email, onde Ferreira de Oliveira considera que os «objectivos da greve não são nem justos nem possíveis de satisfazer», e esgrime o aumento de 1,5% decidido sem o acordo dos sindicatos como um «aumento relevante do poder de compra».

Justificando a sua posição, o presidente executivo da Galp Energia fala do «contexto exógeno extremamente difícil» em que a empresa laborou em 2009, especificando que «os mercados ibéricos de produtos petrolíferos e gás natural caíram cerca de 10%; o preço médio do crude caiu 37%; as margens de refinação foram inferiores às do ano anterior em mais de 60%; o preço do gás natural nos mercados spot mais do que 50%». Conclusão, «todos» têm de fazer sacrifícios.

O que Ferreira de Oliveira não diz aos «estimados colegas e colaboradores» – terá sido por esquecimento? – é que no mesmo ano – o ano de todas as crises, como governantes, patrões, dirigentes partidários «com vocação de poder» e comentadores mais ou menos encartados não se cansam de repetir aos trabalhadores portugueses – a Galp Energia apresentou lucros de 213 milhões de euros (213 000 000€).

Também certamente por esquecimento, Ferreira de Oliveira omite que em 2009 os administradores da Comissão Executiva da Galp Energia receberam, entre remunerações mensais – que oscilam entre 25 000 e 76 400€ –, remunerações variáveis e um vasto leque de mordomias pouco consentâneas com a «grave crise», a módica quantia de mais de 6,2 milhões de euros (6 200 000€).

E não fala igualmente – sem dúvida para não fazer enjoar os «estimados colegas e colaboradores» – do seu próprio vencimento, o qual, a fazer fé em notícias vindas a público, dá para grandes canseiras, como fazer mil viagens às Maldivas.

Ou seja, traduzindo por miúdos, apesar da «crise económica em que vivemos», a Galp Energia apresentou lucros de milhões e continuou a pagar principescamente aos seus administradores, mas quando os «estimados colegas e colaboradores», vulgo trabalhadores, reivindicam uma mais justa redistribuição da riqueza que criaram, aqui d'el rei que se está a comprometer o futuro da empresa e das gerações vindouras.

Instalados nos seus belos cadeirões de couro, os senhores administradores querem fazer acreditar que sem eles o mundo deixaria de girar e que nem um cêntimo de mais valia seria gerado. Prosápia enganadora. Mal ouvem falar de greve é um quem nos acode e um vale tudo, até cartas aos «estimados colegas e colaboradores» com apelos à solidariedade. Só não chega a ser ridículo porque revela uma profunda verdade: sem os trabalhadores não há riqueza. Os que se apropriam dos lucros sabem-no bem, por isso têm tanto medo da luta de classes.
  • Anabela Fino

sexta-feira, 16 de abril de 2010

CHEIROS DE ABRIL
Nuclear


Foi divulgada a nova doutrina nuclear (NPR) dos EUA. A comunicação social destacou a nova promessa de «não usar ou ameaçar usar armas nucleares contra estados que não possuam armas nucleares, sejam signatários do NPT [Tratado de Não Proliferação Nuclear] e cumpram com as suas obrigações de não proliferação nuclear». A declaração foi apresentada como prova do «pacifismo» do actual Presidente dos EUA. Que não haja ilusões.

Que uma declaração de que não se pretende usar armas nucleares contra quem não as tem seja visto como um passo importante, revela bem quão agressiva e perigosa é a maior potência imperialista do planeta. Mesmo esta modesta declaração parece não ter sido pacífica, uma vez que a NPR foi divulgada com vários meses de atraso sobre o previsto. Mas os EUA continuam a reservar-se o direito de lançar um ataque nuclear inicial contra países que têm armas nucleares, países onde vive quase metade da Humanidade: a China, a Rússia, a Índia, o Paquistão, além dos aliados dos EUA (Reino Unido, França, Israel). Potenciais alvos de ataques nucleares são também países que sejam considerados prevaricadores da não-proliferação e o documento faz questão de citar dois: Irão e Coreia do Norte. Apesar de invectivar contra países que considera não respeitarem o NPT, o documento dos EUA nada diz sobre os países que nem sequer assinaram o Tratado de Não Proliferação. A razão é óbvia: entre eles está Israel – a única potência nuclear do Médio Oriente e fiel aliado dos EUA. Que já ameaçou repetidamente atacar o Irão. Os dois pesos e duas medidas estão para durar. Para que não fiquem dúvidas, a NPR diz textualmente: «Os Estados Unidos não estão preparados, no momento actual, para adoptar uma política universal que considere que o único objectivo das armas nucleares seja desencorajar um ataque nuclear». A NPR declara que os EUA querem impor a sua visão de não proliferação, incluindo «controlar todo o material nuclear vulnerável a nível mundial, no espaço de quatro anos», deixando antever que as profissões de fé «pacifistas» serão usadas para reforçar a agressividade da potência imperialista.

Há factos que não podem ser esquecidos: os EUA têm o maior orçamento militar da História, igual às despesas militares de todos os restantes países juntos. Estão empenhados em múltiplas guerras e agressões. Estão empenhados na militarização do espaço e no desenvolvimento de «uma arma que possa colmatar o vazio [resultante de cortes no arsenal nuclear]: mísseis armados com ogivas convencionais que podem atingir qualquer parte do planeta em menos duma hora» (Washington Post, 8.4.10). Este novo sistema ofensivo dá pelo nome de «Prompt Global Strike» (Ataque Global Rápido). O Washington Post relata a reacção do Ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Lavrov: «Os estados do mundo dificilmente aceitarão uma situação em que as armas nucleares desapareçam, mas armas não menos desestabilizadoras surgem nas mãos de alguns membros da comunidade internacional». O general na reserva russo, Leonid Ivashov, usa linguagem menos diplomática: «o conceito Prompt Global Strike visa sustentar o monopólio dos EUA na esfera militar e alargar o fosso entre si e o resto do planeta. Em conjunto com a instalação de defesas missilísticas que visam tornar os EUA imunes a ataques de retaliação da Rússia e da China, a iniciativa Prompt Global Strike irá tornar Washington num ditador global na era moderna. Na sua essência, a nova doutrina nuclear dos EUA é um elemento do novo conceito estratégico de segurança que seria mais adequadamente descrito como uma estratégia de total impunidade. Os EUA estão a aumentar o seu orçamento militar, desencadeiam a NATO como gendarme mundial e planeiam exercícios de vida real no Irão para testar na prática a eficiência da iniciativa Prompt Global Strike. Ao mesmo tempo, Washington está a falar dum mundo totalmente livre de armas nucleares» (citação extraída dum artigo de Rick Rozoff, www.globalresearch.ca, 11.4.10). A justa e necessária desnuclearização global passa pela derrota do militarismo imperialista.
  • Jorge Cadima

quinta-feira, 15 de abril de 2010

CHEIROS DE ABRIL
Os elogios de Soares


Os elogios de Mário Soares a Passos Coelho dizem tudo, ou quase tudo, sobre as águas por onde navegam os dois partidos com maiores responsabilidades na política de desastre económico e social que tem sido imposta ao país nestes 34 anos.

«Muito hábil, politicamente, seguro de si e sabendo o que quer e sem pressas» eis o retrato feito pelo fundador do PS que caracterizou os dois discursos de Passos Coelho no XXXIII Congresso do PSD como «sensatos e inteligentes» acrescentando que «Com Passos Coelho não vai continuar o clima de permanente crispação que criou Manuela Ferreira Leite(...) quer ver como as coisas vão evoluir e arrumar, com tempo, a sua própria casa».

Nas inquietantes e perigosas afirmações lançadas a partir daquele congresso – mais privatizações, redução do valor dos salários, revisão constitucional, novas leis eleitorais - Mário Soares vê sensatez e inteligência. Não lhe repugna a ideia de se ir mais longe na política de direita, da RTP ser entregue a um qualquer Balsemão, que a próxima revisão constitucional liquide ainda mais o acervo de direitos aí inscritos, que os magros salários ainda possam ser reduzidos.

É o taticismo e a sinceridade de Mário Soares a funcionar no seu mais fino recorte, o seu sentido de missão junto do grande capital. Sabe que o tempo, tal como afirmou o banqueiro Ricardo Salgado (BES) durante o fim-de-semana, «não é de eleições». É o tempo do PS ir tão longe quanto possa na ofensiva contra os trabalhadores, o Povo e o país prevista no PEC, sendo que lá para diante se vão desenhando as alternâncias do costume para garantir que continue a mesma política pela mão do PSD, com ou sem a muleta do CDS.

Num momento em que se desenvolve a todo o vapor a velha operação de «reciclagem», desta feita do PSD, para que este assuma o governo depois do trabalho sujo do PS, e quando, simultâneamente, o discurso ultra-liberal do PSD abre caminho para que alguns mais assustados se voltem a encostar ao PS - partido que tantos sacrifícios tem imposto ao Povo - ganha maior acutilância a afirmação de que a questão decisiva não é a da mudança de caras ou de Governo, mas sim, a de uma inequívoca e necessária ruptura com esta política que só pode ser protagonizada com o PCP e construída pela luta de massas.

  • Vasco Cardoso

domingo, 11 de abril de 2010

CHEIROS DE ABRIL
Que grandes artistas!

 

 
Há que reconhecer que os partidos da política de direita – PS, PSD e CDS-PP – adquiriram, na sua longa experiência de vida em comum, uma capacidade histriónica notável.
 
Só grandes «artistas» seriam capazes de representar a farsa que todos eles representam há 34 anos: os que estão no governo a executar a política de direita comum aos três, bramando contra a «oposição» dos que lá não estão fisicamente; os que estão na «oposição» bramando contra a política que fariam se lá estivessem, e preparando-se para cumprir o seu turno.
 
É certo que, no turno de Sócrates, as coisas complicaram-se para os dois de turno à «oposição»: a representação tornou-se-lhes muito mais difícil, na medida em que a política praticada pelo Governo PS/Sócrates não dá margem para apresentar propostas mais à direita – mesmo assim, veja-se a forma brilhante como disfarçaram o facto óbvio de que o OE/PEC (ou o PEC/OE, para o caso tanto faz) é a menina dos olhos dos três.
 
Quanto ao PS debate-se com o difícil problema de justificar como é que um partido que se diz de «esquerda» concilia essa qualidade com a postura de principal artífice de uma política de direita durante mais de três décadas (isto, não obstante a ajuda preciosa fornecida por figuras como Mário Soares e Manuel Alegre, os quais, alinhando sempre com essa política de direita, conseguem fazer-se passar, quando é necessário, por seus fervorosos opositores).
 
Nos últimos tempos, os três da política de direita têm vindo a digladiar-se numa operação de arremesso de «casos», que não parece, mas é, essencialmente de auto-defesa: ora toma lá com o freeport, que é para saberes como é; ora encaixa lá o bpn, que é para não te ficares a rir - ora apanha lá com a pt/média, e vai-te curar; ora afunda-te lá com os submarinos, e pianinho…
 
Enquanto isso e com tudo isso – e graças aos média dominantes, que direccionam o alarido de acordo com os interesses dos seus donos - vão procurando desviar as atenções do que é essencial. E tentando desesperadamente esconder que esses «casos» todos são decorrências normais da política de direita que todos defendem e com a qual fazem a vida negra à imensa maioria dos portugueses.

  • José Casanova

quinta-feira, 8 de abril de 2010

CHEIROS DE ABRIL
O regresso da vírgula

As vírgulas são uma praga de que não nos conseguimos livrar, seja por infestarem os textos sem rei nem roque quando em excesso, fazendo com que a leitura se transforme numa corrida de obstáculos ou de ataque de soluços, seja por primarem pela ausência, deixando-nos à deriva num oceano de letras e em permanente risco de sermos engolidos pelas vagas alterosas do texto. Também há, claro, as vírgulas rigorosamente aplicadas, o que já vai sendo raro, e as outras – topo de gama –, conhecidas por «cirúrgicas».

Haverá quem se lembre de uma vírgula assaz cirúrgica que ficou famosa por – dizem as más línguas – ter como alegada paternidade Almeida Santos, presidente do PS, que com tal pontuação terá alterado radicalmente o sentido de um texto legislativo. O caso não ficou provado – olha o espanto! –, mas o recurso à vírgula passou a fazer parte das reservas da nação.

Ainda esta semana o porta-voz dos utentes do Centro de Saúde de Valença, Carlos Natal, falou da «vírgula» ao contestar as explicações do Governo para o encerramento nocturno do Serviço de Atendimento Permanente (SAP) local. Segundo o executivo, a média de utentes por noite, em 2009, foi de 1,7 pessoas; de acordo com Natal, terá sido de 17 pessoas. «Alguém se lembrou de meter, deliberadamente, uma vírgula no meio», acusou.

Com vírgula ou sem ela o facto é que Valença está em pé de guerra. Depois de vigílias, cortes de estrada, marchas e muitos protestos Valença começou a encher-se de bandeiras espanholas, uma original forma de dizer que as autoridades da Galiza se preocupam mais com a saúde dos valencianos do que Lisboa. E tanto assim é que o alcaide de Tui já manifestou total disponibilidade para receber os doentes portugueses no Centro de Saúde da cidade (onde nem se paga taxas moderadoras), admitindo reforçar o respectivo pessoal médico e de enfermagem se a afluência de portugueses o justificar. Poderá não ser um caso de vírgulas, mas se restar um pingo de vergonha em S. Bento, é caso para mudar de texto.
  • Anabela Fino

quarta-feira, 7 de abril de 2010

CHEIROS DE ABRIL

TEORIA OCIDENTAL DA RELATIVIDADE

Pequeno desenho enviado por um médico do SMG (Syndicat de la Médecine Générale) para ilustrar alguns dos comentários...


- 90 pessoas têm a gripe H1N1 e todo o mundo tem que usar uma máscara.

- 5 milhões de pessoas têm SIDA e ninguém quer usar preservativo!

- 1000 pessoas morrem de gripe num país rico, é uma pandemia.


- Milhões de pessoas morrem de malária em África - é o seu problema...

sábado, 3 de abril de 2010

CHEIROS DE ABRIL

A crise do capitalismo, o PEC e a luta

Ao contrário do que ainda há poucos meses afirmavam os arautos do sistema, a crise capitalista desencadeada nos EUA em finais de 2008 está para dar e durar. De um dia para o outro a tónica do seu discurso passou de esperançosos «sinais de recuperação», para a de mais e «inevitáveis sacrifícios», antecipando mesmo que o que se seguirá não será a solução mas o agravamento dos problemas, desde o desemprego à segurança internacional.

O grande capital financeiro, a fracção do capital que cada vez mais fundido com o poder do Estado comanda ferreamente a dinâmica do sistema, não só não está disposto a abrir mão dos seus fabulosos lucros (é essa a sua natureza) como está a utilizar a crise que ele próprio provocou, para intensificar a exploração, liquidar conquistas sociais e direitos democráticos alcançados por décadas de duras lutas, reforçar o seu próprio poder.

Mais ainda. Num quadro em que o capitalismo não se encontra condicionado pela competição e comparação com o socialismo e a sua evidente superioridade social, os arautos do sistema, que sempre o apresentaram como a mais avançada de todas as formas de sociedade, estão a congeminar para o «pós-crise» cenários de brutal recuo civilizacional em que, mesmo os direitos mais elementares hoje consagrados na Carta da ONU e no Direito Internacional, seriam letra morta. É neste sentido que apontam as políticas de «ajuste» que estão a lançar para cima dos trabalhadores e dos povos, os custos das gigantescas injecções de capital que salvaram e engordaram o sistema financeiro. É neste sentido que aponta o Programa de Estabilidade e Crescimento que o Governo do PS, de braço dado com os partidos da direita e submisso às exigências da UE, quer impor ao povo português. É neste sentido que apontam as teorias de que se tem «vivido acima das possibilidades» e não será mais possível «viver como dantes», sendo necessário acabar com a «anomalia do Estado social europeu». É neste sentido que aponta um «novo paradigma de crescimento» capitalista, em que tudo seria transformado em mercadoria e o trabalhador reduzido à condição de simples produtor de mais valia.

Tão ambiciosos projectos de regressão não passam por ora disso mesmo, de projectos. A resistência e a luta que se desenvolve por todo o mundo pode derrotá-los. Mas eles existem e são realmente perigosos pois são acompanhados de uma frenética corrida aos armamentos num quadro em que se multiplicam as agressões imperialistas e os focos de tensão que (como bem mostram os antecedentes da 2.ª Guerra Mundial, da invasão japonesa da Manchúria a Munique, passando pela guerra Civil de Espanha ou pela invasão da Etiópia por Mussolini), podem vir a ter desenvolvimentos imprevisíveis. Tanto mais que se agudizam as rivalidades e as contradições inter-imperialistas, com os EUA a insistir numa afirmação de «liderança» que já não corresponde ao seu peso real no xadrez mundial, um Japão onde renasce o militarismo e crescem pretensões hegemónicas na região Ásia-Pacífico, a «grande» Alemanha a submeter a UE aos seus interesses como se viu no último Concelho Europeu em torno da chamada «ajuda» à Grécia, num processo que abalou seriamente a credibilidade do euro e que levou mesmo um «europeista» tão empedernido como Filipe Gonzalez, presidente do «Grupo de reflexão sobre o futuro da União», a afirmar que «a situação da UE é de emergência».
 

Neste quadro a luta dos comunistas e o reforço da sua solidariedade internacionalista é insubstituível. Contra a exploração, contra o militarismo e contra a guerra. Pelo fortalecimento da frente anti-imperialista. Tirando partido das dificuldades e contradições entre as grandes potências capitalistas. Neste sentido é de realçar a importância da posição comum aprovada na recente reunião do Grupo de Trabalho dos Encontros de Partidos Comunistas e Operários realizada em Lisboa, a propósito da Cimeira da NATO que terá lugar em Novembro em Portugal.
  • Albano Nunes

quinta-feira, 1 de abril de 2010

CHEIROS DE ABRIL

Receita da morte lenta

Em tempos que já lá vão a «morte lenta» era a designação que eu e um grupo de amigos dávamos a uma simpática tasquinha onde nos reuníamos à hora de almoço, sem pressas nem stress, para alimentar o corpo e desanuviar o espírito.

 O tempo parecia não passar por ali e os pratos saiam da cozinha a um ritmo próprio, sem condescendências pelos roncos do estômago e num desprezo total pelos viperinos comentários dos clientes. A comida chegava quando chegava e pronto, mas quando chegava fazia-nos esquecer todas as mágoas, pelo que durante anos fomos voltando, voltando, voltando sempre.

Um dia, depois das férias, o grupo ficou à beira da apoplexia quando descobriu que a «morte lenta» tinha virado «manjedoura», as madeiras tinha passado a cromados e da cozinha do nosso (des)contentamento não havia nem rasto. Órfãos de todo mudámos de poiso e os almoços perderam o encanto. Anos mais tarde, numa de saudosismo, voltei ao local. A «morte lenta» estava transformada em dependência bancária. Era o progresso.

Lembrei-me disto agora a propósito das declarações de Mira Amaral, ex-ministro da Indústria e Energia e actual presidente do banco BIC Portugal, a propósito do Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC). O ex-ministro, falando esta terça-feira à TVI, teceu fortes críticas à política do Governo e considerou que Portugal está «numa trajectória de morte lenta».


Na abalizada opinião de quem não serviu o País mas garantiu o (seu) futuro, as mudanças que importa fazer na economia portuguesa exigem um entendimento entre PS, PSD e CDS/PP (como se não fosse isso mesmo que sempre acontece...).

Mas isso já não chega, diz Mira Amaral, acrescentamos que «nós também temos que mudar de vida; as famílias têm que consumir menos e poupar mais, o Estado tem que gastar menos e as empresas têm que reduzir despesas supérfluas e aumentar a competitividade e os trabalhadores têm de trabalhar mais horas». É claro que o «nós» de Mira Amaral é majestático. Ele prescreve a receita de sempre e os outros que tomem a pílula.

  • Anabela Fino
  • JCP
  • pcp
  • USA
  • USA