quinta-feira, 20 de novembro de 2008


«Cortem-lhe a cabeça»

Aqui se volta ao livro de Lewis Carroll e à intervenção recente de M. Alegre. Na «Alice no País das Maravilhas», a «Rainha de Copas» gritava incansável «cortem-lhe a cabeça!», mas não passava da proclamação - «é tudo imaginação dela, nunca chegou a executar ninguém», explicava o grifo.

A semana passada, aqui se escreveu, com verdade, que Alegre votou a favor do OE, o instrumento mais essencial da continuidade da política de direita, que trouxe o País até esta situação de crise, em rápido agravamento, e que votou positivamente a salvação dos banqueiros do BPN (e não só), que abicharam lucros obscenos e vão agora concentrar ainda mais capitais. Mas escreveu-se também que se tinha abstido no Código de Trabalho – um erro de informação, que aqui se rectifica para os efeitos devidos. Alegre votou contra e esse é um facto a registar, já que o fez apenas meia dúzia de vezes na legislatura. Fica também registado que o seu voto só foi confirmado quando ficou garantida a aprovação da legislação que dá corpo a esta ofensiva brutal contra os direitos dos trabalhadores.

No rescaldo veio a entrevista de meia capa mais seis páginas do DN de domingo, que foi tratada em certos media como se cortasse a cabeça a Sócrates. Mas em substância diz Alegre – que já passou o «tempo e a idade» (projecto nunca houve!) de disputar o poder no PS, que está em «reflexão» sobre participar em campanha eleitoral, desde que não apoie «pessoas» (quem?) «que não têm a ver» com ele – não é o caso de Sócrates com quem tem «boa relação pessoal» -, diz que «dificilmente» será candidato a deputado (só a Presidente da AR?), sobre presidenciais é o novo «Tabu», repete os números da votação anterior, e vai falando da «forte corrente» e do «dever cívico» – quando é que começa a «vaga de fundo»(?).

Sobre o PCP diz «não parece que queira aliança nenhuma», «nunca a quis»- assim se ilude sem escrúpulos a questão da ruptura com a política de direita e do caminho da construção da alternativa -, mas já no BE «há pessoas que tentam criar pontes», Louçã, como Sócrates, é «pessoa de qualidade».

De Alegre registe-se a teimosia. Há anos que esbraceja a sua «oposição» aos Governos do PS e às suas políticas, mas sobra apenas a «florzinha de esquerda» na casaca da política de direita.Proclama «cortem-lhe a cabeça» -, mas «é tudo imaginação».
  • Carlos Gonçalves


Vencer

Mário Nogueira, líder da FENPROF, foi muito claro na passada terça-feira à saída de um encontro com a Comissão Parlamentar de Educação a convite do seu presidente, o deputado do PS José Seguro: «Sem a suspensão da avaliação de desempenho não é possível haver qualquer outro passo para resolver este problema».

A declaração surgiu na sequência da luta generalizada decidida pelos professores em reunião do dia anterior, exigindo a suspensão do actual modelo de avaliação da carreira docente.

O próprio José Seguro fez questão de declarar que «nós consideramos ser essencial ouvir os professores e criar condições para que o diálogo seja o melhor instrumento», entrando em consonância com a opinião generalizada dos comentadores a compreender a revolta maciça dos 140 mil professores do País contra um modelo de avaliação de desempenho que, além de imposto vexatoria e autoritariamente pelo Ministério da Educação, é notoriamente absurdo e injusto.

Todavia, nessa mesma noite, a ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, afogueava-se frente a uma bateria de microfones, convocados em conferência de imprensa, para exibir a sua já famosa irredutibilidade. Começou por garantir que «hoje a avaliação é um adquirido para todas as escolas» que «têm preparado os instrumentos, os modelos, todos os procedimentos necessários à concretização da avaliação», insistindo em ignorar que, nessas escolas, a única coisa que se tornou adquirida é que este modelo de avaliação dos docentes é um alvo a abater pela generalidade dos professores.

Mas ao ser confrontada com a exigência da suspensão imediata deste modelo de avaliação apresentada por todos os sindicatos e conselhos de escola, a ministra lá concedeu que «continua a analisar o que se passa em todas as escolas e, no momento próprio, tomará as decisões que forem necessárias tomar», recuo disfarçado com «a garantia» de que «a avaliação de desempenho dos professores se fará».Quem bateu de seguida na mesma tecla foi o primeiro-ministro José Sócrates, ao repetir a lengalenga de que «ninguém tem o direito de violar a lei».

Mas quis tanto zurzir nos sindicatos em geral e na FENPROF em particular, que começou por hesitar quatro vezes para completar a frase «o dever dos sindicatos é defender o...» (à quarta hesitação lá atamancou a coisa com «...os seus associados») para finalmente, decretar que «não são os sindicatos que vão a votos. E se os sindicatos acham que vencem o Governo apenas porque o Governo está próximo das eleições estão enganados».Quem está rotundamente enganado é José Sócrates, e nem dá por isso.

Primeiro, os sindicatos vão a votos – e de todos os que representam -, ao contrário da sua ministra da Educação, que foi por ele escolhida.

Segundo, os sindicatos não querem vencer o Governo, mas suspender esta avaliação de desempenho.

Quem quer vencer os sindicatos é o primeiro-ministro, e o verbo escolhido por Sócrates não mente: realmente, um primeiro-ministro que não percebe a derrota de uma política de Educação quando a vê repudiada por 80% dos seus profissionais, manifesta, obviamente, um desprezo objectivo por quem trabalha.

Querer vencer os sindicatos, neste quadro mental, é mera decorrência.


  • Henrique Custódio


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