sábado, 5 de junho de 2010

Concertação
 

 
Uma responsável sindical afirma: «[….] o nosso país destaca-se, por exemplo, pelo “aumento fenomenal do desemprego” [….] e pelo ataque perpetrado pelo Código do Trabalho aos instrumentos de protecção e regulação do mercado de trabalho [….]». Tem, evidentemente, toda a razão, e ainda mais se pensarmos que quando estas palavras foram proferidas a taxa de desemprego era de cerca de 5% e hoje ultrapassa os 10,8%.
 
A mesma responsável sindical afirma sobre o Pacto de Estabilidade e Crescimento: «[…] este pacto é um “colete-de-forças” e […] o Banco Central Europeu e a maior parte dos governos nacionais parecem ter-se esquecido da componente crescimento do pacto. Ora, a Europa vive uma fase de desaceleração do seu crescimento económico e os seus Estados membros estão impossibilitados de utilizar outros mecanismos, como mexer na moeda, pelo que há que flexibilizar a interpretação de algumas áreas do Pacto de Estabilidade e Crescimento[….]».
 
Ainda a mesma responsável afirma, preocupada: «[….] Uma das questões básicas para as organizações sindicais, a igualdade de tratamento dos trabalhadores nas agências de trabalho temporário e nas empresas onde vão operar, não obteve consenso no Conselho. Há assim agora uma proposta de um regime de excepção de 10 meses, quer a nível salarial quer a nível de protecção social, para os trabalhadores colocados nas empresas por agências de trabalho temporário. Esta situação é tão mais grave quando a maior parte destes trabalhadores tem em média um contrato de 6 meses numa empresa. Com esta proposta praticamente a totalidade dos trabalhadores temporários estaria sem qualquer tipo de protecção [….]».
 
Quem expôs estas preocupações - em 5.10.2003 - foi a actual ministra do trabalho do Governo Sócrates, Helena André. Exactamente a mesma que, sete anos passados, considera que uma ainda maior redução dos apoios aos desempregados é forma de «incentivar o seu regresso ao mercado de trabalho».
 
A mesma que, perante a gigantesca manifestação de 29 de Maio, veio afirmar que «o que o país precisa é de mais concertação e de menos contestação», ou seja, que os trabalhadores e o povo deveriam comer e calar o PEC concertado entre PS e PSD.
 
Com gente desta, sem princípios nem vergonha, o que é que se há-de fazer?
  • Filipe Diniz
Bestas
 

 
Teixeira dos Santos foi a Wall Street tocar o sino. Não aquele de que quase todos guardamos imagem, accionado logo que fosse depositada a modesta moeda na tromba da volumosa criatura. Ali em Wall Street a coisa tem nome mais fino - «opening bell»; em vez dos tostões a coisa funciona em milhões; e o mundano e mais rudimentar processo do entra-moeda-sai-cenoura ali estará substituído pelo mais labiríntico jogo das cotações e dividendos que, simplificando, conduzirá ao desejado robustecimento da besta, no caso, especulativa.
 
Acompanhado pelos mais altos responsáveis das empresas do PSI 20 – essa instituição maior dos mercados e da especulação financeira cá da praça – Teixeira dos Santos terá ido, ao que nos dizem, acalmar os «mercados». Pelo que vimos e ouvimos, pela companhia escolhida e pelo lá anunciado, diríamos que foi vender o país. A deslocação tem um triplo significado. Primeiro, o de em tempos de crise e da necessária resposta no plano económico, Teixeira dos Santos ter deixado confirmado que a opção da política governativa é a da prioridade absoluta aos centros financeiros e ao jogo especulativo que neles medra. Segundo, o da confirmação (dispensável, dir-se-ia com verdade) de que o discurso sobre as malfeitorias do «mercado» – essa «besta» quando se trata de o invocar nos momentos de imposição de sacrifícios – soçobra na rendida veneração e empenhado estímulo que o Governo lhe dedica. O Governo e a sua visão económica não enxerga para lá do que os olhos do capital vêem, não vai além do que os interesses dos mercados financeiros lhe ditam, escolhe sem hesitação o lado dos que contra o país especulam. Terceiro, e seguramente o não menos importante, o desprezível acto de submissão nacional aos interesses e gula das praças especulativas financeiras que o anúncio da venda da EDP e da GALP feita naquele antro representa – a confirmação de que nestes processos de centralização e concentração capitalista e de estímulo aos processos especulativos há quem esteja disposto a vender o país.
 
Não impunemente. Tal como a história o testemunha nas não poucas traições e entregas de Portugal ao estrangeiro, esta política e os seus autores acabarão como os Andeiros deste país.
  • Jorge Cordeiro
 
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