sábado, 25 de junho de 2011

«Candidatadas»


«Vou ouvir, como é próprio, os órgãos internos do PSD e amanhã apresentaremos um novo candidato» .

Foi com estas palavras que Pedro Passos Coelho, primeiro-ministro indigitado, justificou anteontem na Assembleia da República a derrota algo ridícula, e sem dúvida humilhante, sofrida por si próprio e o seu partido, ao ver recusada, por duas vezes consecutivas, a candidatura à presidência da AR em que pessoalmente se empenhara.

Se também houvesse considerado «próprio» ouvir o seu partido quando decidiu convidar Fernando Nobre para encabeçar a lista do PSD por Lisboa a troco da promessa de o fazer eleger presidente da Assembleia da República, provavelmente ter-se-ia poupado a este dissabor.

Isto porque é espectável haver gente no PSD com discernimento suficiente para advertir Passos Coelho acerca de algumas realidades, como a de que o lugar de presidente da Assembleia da República não é coisa que se deva ou possa (como se viu) prometer, por resultar de uma eleição na AR por voto secreto e com maioria absoluta.

Para que a manobra resultasse, Passos Coelho deveria, pelo menos, assegurar-se do apoio antecipado ao seu negócio com Fernando Nobre por parte dos putativos aliados do CDS-PP – coisa que não fez, como Paulo Portas abundantemente alardeou, marcando pontos, de caminho, na sua posição relativa nos arranjos governativos.

Neste caricato episódio Paulo Portas terá sido, mesmo, o único mas pirrónico vencedor: ao inviabilizar a eleição de Fernando Nobre consolidou o seu poder na coligação com o PSD mas, concomitantemente, também enfraqueceu publicamente Passos Coelho, e isso não augura um futuro ridente à «coligação» - para bem do povo e do País, aliás.

Seja como for, esta «candidatada» é um episódio menor que sobreviverá, quando muito, em nota de rodapé.

O que, no caso, importa reter é o que levou Passos Coelho a precipitar-se neste bisonha promessa a Fernando Nobre, na ilusão de que este saltitante candidato (com uma «independência» que já o enfileirou no PS, no BE e no PSD) lhe traria uma enxurrada de votos, em vez de uma interminável dor de cabeça.

Esta sucessão de inabilidades por parte do presidente do PSD («convite» a Nobre para um cargo electivo, unilateralidade da decisão, insistência «à outrance» nesta aposta errada) o que revela - e cristalinamente - é uma ambição tão impaciente em «chegar ao pote» do poder (palavras do próprio), que levou Passos a deitar mão a tudo o que calhava para arrebanhar mais uns votos. Até ao desqualificado Fernando Nobre, que ainda há poucos meses malbaratara, numa demagógica e reaccionária campanha presidencial, um prestígio laboriosamente cerzido nas deambulações da AMI.

Assim, apesar deste desaire constrangedor, Pedro Passos Coelho obteve o que queria: instalar-se no poder para, sob o pretexto e o império da obediência à troika, poder finalmente desmantelar o que resta do Portugal democrático e solidário criado pela Revolução de Abril.

Todavia, há-de perceber que não se rouba, impunemente, futuro a um povo.
Henrique Custódio

segunda-feira, 20 de junho de 2011

A escolha certa


Ao cognome de pai da política de direita, Mário Soares junta um rol infindável de epítetos da mesma família.

E o facto de, sendo ele o maior inimigo da democracia de Abril, lograr fazer-se passar por «pai da democracia», faz com que lhe assente como uma luva o título de rei dos embusteiros.

Curiosamente, à medida que a idade lhe vai pesando – e à semelhança do criminoso que volta ao local do crime para apreciar a obra feita - ele desdobra-se em revelações sobre as suas actividades ocultas, desnudando-se e expondo as vergonhas, das quais, babado, se orgulha.

Disse ele, há dias, relembrando a concentração de 19 de Julho de 1975: «Conspirei activamente com D. António Ribeiro». E explicou: «todos os párocos disseram nas igrejas que seria bom que os católicos se juntassem na Fonte Luminosa contra o PCP». E confessou: (sem o apoio da Igreja) «nós não teríamos conseguido aquela manifestação que derrubou, no fundo, o caminho para onde se estava a dirigir o País».

Dizendo o que disse, Soares não disse nada que não se soubesse: a novidade está em ser ele a dizê-lo... sabendo bem que as razões que levaram a alta hierarquia da Igreja a apoiá-lo contra Abril são, no essencial, as mesmas que a levaram a apoiar o regime fascista durante quase meio século.

Notícia foi, também, o encontro Soares/Carlucci, na embaixada dos EUA - provavelmente na mesma sala onde, no auge da contra-revolução, ao abrigo do investimento nele feito pela CIA, era semanalmente recebido para despacho.

Recorde-se que Carlucci - o mandante e pagador - era senhor de um notável currículo nesta matéria, comprando quem se lhe vendia e eliminando pragmaticamente os que, com dignidade, recusavam trair os seus povos e as suas pátrias.

Desde novo, ele esteve em todo o lado onde a democracia, a liberdade e os direitos humanos o chamavam: no Congo, onde organizou o bárbaro assassinato de Patrice Lumumba, em 1960; na Tanzânia, donde foi expulso por ligação ao golpe contra Nyerere, em1964 – dali partindo para o Brasil com a tarefa de assegurar a execução de vários dirigentes progressistas.

E estava em Portugal para o que desse e viesse.

No Congo, face à dignidade de Lumumba, fez o que fez.

Em Portugal, fazendo de Soares o seu homem de mão, fez a escolha certa.

  • José Casanova
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