sexta-feira, 30 de julho de 2010

Já basta!


(...) «Basta de gente que ganha num dia aquilo que outros ganham num ano. Tem que haver alguém que ponha cobro a isto e que tenha coragem.» (...) «O investimento deve ser feito em bens verdadeiramente úteis e não em realidades virtuais, que estiveram na base da crise financeira mundial.» (...) «É preciso ultrapassar o capitalismo neoliberal, pois a crise é também uma crise de valores.»

As palavras são do bispo auxiliar de Lisboa, D. Carlos Azevedo, que a semana passada desafiou os políticos portugueses a abdicar de 20 por cento dos seus salários em benefício de um fundo social. A proposta surgiu no seguimento da reunião extraordinária do Conselho Consultivo da Pastoral Social que pediu «mais responsabilidade social e política perante a crise» e «soluções corajosas» para a ultrapassar.

Mesmo considerando, numa leitura mais fina, que o bispo poderia ter ido muito mais longe – e logo aproximar-se muito mais da verdade – se tivesse dito, por exemplo, que «basta de gente que ganha num dia aquilo que muitos e muitos outros Não ganham numa vida inteira de trabalho», há que reconhecer que não é difícil – diria mesmo que é bastante fácil – comungar das opiniões reproduzidas acima. O que é difícil, isso sim, é conjugar estas palavras com o resto do discurso do eclesiástico que actualmente tutela a acção social da Igreja e, sobretudo, conciliá-las com a prática da Igreja católica.

Com efeito, na mesma entrevista em que reconheceu a escandalosa injustiça da repartição da riqueza e invectivou os gestores que ganham ordenados «obscenos» – palavras suas – o bispo Carlos Azevedo também disse que «a crise é tão grave que não poderemos superá-la uns contra os outros: empresários contra sindicatos, sindicatos contra patrões, Governo contra Oposição e Oposição contra Governo.» A solução? Um «pacto social sustentado e justo» entre cidadãos, partidos, sindicatos e empresários. Houve quem, como Mário Soares, se confessasse «impressionado» pela «lucidez e coragem» de D. Carlos Azevedo e, sem rebuços, «aplaudisse». Outros, menos exuberantes, foram dizendo «nim», que isso de fazer caridade pode ser muito católico mas 20 por cento sempre é 20 por cento, mas lá que um pacto dava jeito, isso dava...

Pois é, milénios de vida têm essa vantagem: num parágrafo alimenta-se a sede de justiça dos oprimidos, noutro cuida-se dos interesses dos opressores. Porque isto de pactos entre patrões e sindicatos, exploradores e explorados, direita e esquerda, algozes e vítimas não passa de poeira para os olhos destinada a prevenir o que de facto assusta a Igreja, ou seja o reconhecimento de que «situações extremas de pobreza e de fome podem conduzir à revolta e à violência, numa sociedade de desigualdades», como bem alertou o bispo.

Para a Igreja, o que está em causa não é acabar com a exploração, é torná-la suportável; não é acabar com a miséria, é mantê-la controlada; não é pugnar pela justiça social, é criar mecanismos de escape para aliviar a pressão. Daí a proposta dos 20 por cento, que afinal mais não é do que a reafirmação do princípio de que sempre haverá ricos e pobres ou, dito de outro modo, uma sociedade de classes em que uns vendem a força de trabalho ou estendem a mão à caridade, e outros se apropriam do lucro.

De facto, já basta! Mas esta realidade só a luta a pode alterar.

  • Anabela Fino

quinta-feira, 29 de julho de 2010

O pai da política de direita


 
Às terças-feiras, infalivelmente, Mário Soares enche, de cabo a rabo, uma página do Diário de Notícias (só legível por dever de ofício, diga-se, em abono da verdade).

 Ali, Soares, de espada em riste, trava a semanal cruzada na defesa daquela que é, inequivocamente, a menina dos seus olhos: a política de direita.

 A política de direita por ele concebida e da qual é o incontestável e incontestado pai; por ele iniciada em 1976, enquanto líder, reconhecido internacionalmente, da contra revolução; e, de então para cá, praticada por sucessivos governos PS/PSD/CDS-PP. Com os resultados que estão à vista.

Ali, Soares faz o elogio repetido do protagonista principal dessa política, na actualidade: José Sócrates, ao qual não se cansa de incentivar e no qual não pára de descobrir inteligência e coragem.

 Ali, Soares exibe a sua condição de propagandista do capitalismo do qual ele tem sido, em Portugal, o maior e mais eficaz defensor nas últimas décadas.

 Ali, Soares faz o incontinente panegírico de Obama, o líder por excelência, afinal o único que, certamente por obra e graça das guerras e ocupações do Iraque, do Afeganistão, da Colômbia, das Honduras, da Costa Rica…, é capaz de assegurar ao imperialismo norte-americano o domínio do mundo.

 Enfim, ali, Soares mostra o que é – e confirma o que sabemos que é.

 Na última terça-feira, os aplausos do pai da política de direita foram para o bispo auxiliar de Lisboa, Carlos Azevedo. Mais precisamente para as declarações por este proferidas – e que os média dominantes se fartaram de divulgar – sobre a «crise» e sobre as «soluções» para a dita.

Das propostas do bispo auxiliar, a que mais fundo tocou a sensibilidade, digamos assim, de Mário Soares foi a do «pacto social sustentado e justo entre cidadãos, partidos, sindicatos e empresários».

 Soares vê na proposta do bispo o «remédio seguro para vencer a crise».

 Porque «a crise toca a todos», não é verdade? E nada melhor do que «o empenhamento de todos, o compromisso solidário», para «vencer a crise», isto é: para assegurar a continuação da política de direita...
  
De que Soares é o pai.
  • José Casanova

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Sem nível nem regras


«Com esta proposta, num regime semi-presidencial, Pedro Passos Coelho põe-nos ao nível da Namíbia ou do Burkina Faso, países onde não há regras», disse Francisco Louçã, comentando as notícias sobre a proposta do PSD de revisão constitucional.

Vê-se a infeliz declaração do coordenador do BE e há uma parte de nós que fica com a sensação de que desta vez é que o pé do eficiente e infalível Louçã lhe escorregou para a poça. São coisas que acontecem, todos temos deslizes – pensamos –, e podia ter-se dado o caso de um arcaico preconceito ter saído do inconsciente para a boca, sem controlo, para embaraço do cosmopolita Louçã.

Mas parece que não causou vergonha nenhuma. A expressão lá está, repetida como se tivesse dignidade, no portal do BE na Internet, a abrir o artigo sobre a sessão pública em que foi proferida.

Neste pequeno texto não se fazem juízos sobre o Burkina Faso e a Namíbia, não se abordam as propostas de revisão constitucional do PSD, nem se discute o regime semi-presidencialista. É público que o PCP considera que o que faz falta ao País é cumprir a Constituição da República e não introduzir-lhe mais golpes e mutilações.

Neste pequeno texto apenas se anota que a forma que o BE entendeu usar para se referir a estes dois países revela um enorme preconceito, com a habitual dose de populismo e a profunda arrogância de quem vê o mundo dividido entre civilizados e bárbaros, desenvolvidos e primitivos – incluindo-se sempre no grupo dos primeiros.

É uma frase típica do pensamento dominante, que encaixa no preconceito, oriundo do mais escuro colonialismo, que atribui aos países do «terceiro mundo» em geral e aos africanos em particular uma suposta incapacidade, quase genética, de viver em democracia. Uma frase que revela um profundo desrespeito pela história, pela cultura, pelos processos de luta e de independência destes dois países – para os mais distraídos, relembre-se que a Namíbia é independente há apenas 20 anos.

De resto, uma busca rápida pelas enciclopédias digitais revela que são cerca de 35 os países «sem regras» que têm regimes semi-presidenciais, entre os quais a Finlândia e a França, que darão decerto origem a brilhantes trocadilhos em próximas iniciativas do BE.
  • Margarida Botelho

quinta-feira, 22 de julho de 2010



Os «presos políticos»

A decisão do Estado cubano de libertar cidadãos julgados, condenados e presos em Cuba teve uma grande visibilidade mediática. Mas, em vez da verdade, foram as mentiras, a ocultação de factos e as acusações gratuitas contra Cuba que marcaram o tom das notícias veiculadas pelos media dominantes. Mais uma vez, como em tantas outras, o que se pôde ler nos jornais europeus tem muito pouco de notícia e muito de operação de desinformação e intoxicação ideológica.


Não se pretende aqui defender que o assunto não devesse ser notícia. Pelo contrário, deve sê-lo porque não são muitos os países que tomam a decisão de libertar 52 pessoas que participaram numa ampla conspiração internacional contra o Estado e a Constituição desse mesmo país. E aqui reside a grande ocultação e mentira das «notícias» que têm sido publicadas. Os cidadãos ora libertados, e os que o serão ao longo dos próximos meses, não são inocentes e desprotegidos cidadãos cubanos cujo crime seria o de discordarem do regime político da ilha socialista. Não!


Como está bem documentado em provas apresentadas pelas autoridades cubanas e reconhecido por várias organizações internacionais, estas pessoas receberam de países estrangeiros (os EUA) fundos e materiais para conspirar contra o Estado cubano, um crime punido por lei em Cuba e de forma geral em todos os países do mundo. Essa conspiração teve um nome: projecto Varela. Visava por diversos meios derrubar, se necessário pela força e por via de uma invasão militar estrangeira, as instituições cubanas, convocar um parlamento e nomear um governo provisório que tivesse como missão desmantelar o Estado e a constituição socialistas em Cuba. Uma conspiração que envolvia dezenas de organizações, entre as quais várias norte-americanas, coordenada a partir do escritório de interesses dos EUA em Havana, dirigida por Washington e pela máfia de Miami. O facto, e este deveria ter sido notícia, é que estas pessoas foram condenadas por crimes contra a independência e a integridade territorial de Cuba. O facto é que foram pagos a peso de ouro pelos EUA por via de um financiamento milionário norte-americano ao projecto Varela de mais de 40 milhões de dólares

É importante relembrar o período (2002/2003) da prisão destes mercenários. Esse foi o tempo da inclusão de Cuba no “Eixo do Mal” de Bush; das ameaças directas de intervenção militar em Cuba; das acusações de que Cuba possuía armas de destruição massiva e desenvolvia um programa de armas biológicas. O tempo da célebre ameaça de Bush de que o “regime de Castro não mudará por decisão própria”. Foi deste perigo que Cuba se defendeu e foi nesse contexto que os cidadãos agora libertados foram julgados à luz da Constituição da República de Cuba e do seu ordenamento jurídico. Não são portanto presos de consciência ou presos políticos. E tão pouco são exilados, outra mentira repetida mil vezes nestes dias. A decisão de sair de Cuba coube aos próprios, como o comprova a decisão de outros, de ali ficarem a residir. O que sobressai desta libertação é que Cuba, no quadro do exercício da sua inquestionável soberania, acaba de realizar um gesto diplomático importantíssimo.


O futuro dirá da prevalência ou não da hipocrisia das posições dos que defendem medidas criminosas contra Cuba como a posição comum da União Europeia, ou o famigerado bloqueio. Mas tudo isso é relegado para segundo plano. O que interessa para os media é insistir na ladainha dos presos políticos e de uma feroz ditadura vigente na ilha do Caribe. Simultaneamente assobiam para o lado face a verdadeiros crimes como o de Guantanamo onde cerca de 200 prisioneiros são mantidos em cativeiro há anos sem direito a julgamento; como o assassinato pelo exército e paramilitares colombianos de dezenas de milhares de cidadãos colombianos; como o golpe nas Honduras e o assassinato de opositores ao regime golpista ou ainda como o envio de assassinos a soldo para a Venezuela visando a vida do presidente Chavez e de dirigentes comunistas e progressistas venezuelanos. Mas Cuba e os seus amigos já ensinaram ao mundo que sabem resistir e avançar, e é isso que incomoda os seus inimigos.
  • Ângelo Alves

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Trabalhar até morrer
 
A Comissão Europeia voltou à ideia do aumento da idade da reforma, apresentada como única solução para a «sustentabilidade do sistema de pensões». Desta vez propõe o aumento progressivo da idade de reforma até aos... 70 anos em 2060.
 
A argumentação, de tão básica, explica-se depressa: como a esperança média de vida aumenta, é preciso aumentar o tempo de trabalho para que se desconte durante mais anos.
 
É um argumento inaceitável e falso. Inaceitável porque tenta transformar um importante avanço civilizacional, como é o aumento da esperança de vida, num castigo, destruindo o direito do trabalhador a viver a idade da reforma de maneira digna e livre e tentando impor o regresso aos tempos em que se trabalhava até à morte.
 
O que tem posto em risco a sustentabilidade da Segurança Social é a política de direita, com o seu cortejo de ataques: subfinanciamento crónico, fraude e evasão fiscal do grande patronato, crescente desemprego, precariedade, lay-off, reformas antecipadas, deslocalizações de empresas, etc.
 
É completamente falso que a Segurança Social esteja condenada a definhar. O PCP tem proposto de forma reiterada várias medidas para defender e aprofundar o direito à reforma: mais emprego, melhores salários, diversificação das fontes de financiamento da Segurança Social, combate efectivo à fraude e à evasão fiscal, ou a introdução de uma nova contribuição para as empresas em função do seu Valor Acrescentado Bruto.
 
Aumentar a idade da reforma acentuaria ainda mais o desemprego, particularmente entre a juventude, e dificultaria o rejuvenescimento dos diversos sectores de actividade. Num tempo em que os avanços científicos e tecnológicos permitem produzir mais em menos tempo, impor o aumento do tempo de trabalho só interessa a quem quer explorar cada vez mais.
 
Em 2005 foram 120 mil os portugueses que subscreveram o abaixo-assinado do PCP contra o aumento da idade da reforma. Em Portugal, como em toda a Europa, estas tentativas têm encontrado um combate firme por parte dos trabalhadores. Com a sua unidade e luta vai ser possível derrotar mais esta ofensiva.

  • Margarida Botelho

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Ao trabalho, até à Festa



Para muitos comunistas (e não só) que ano após ano participam na construção da Festa do Avante!, as jornadas de trabalho são a verdadeira festa. Aí, apesar do esforço despendido na execução das mais variadas tarefas – ou talvez mesmo por causa dele – sobressai como em poucos momentos o que de mais belo tem o ideal e o projecto comunistas: o trabalho colectivo, a generosidade, a abnegação, a acção comum por um mesmo objectivo.


Aos fins-de-semana (e sempre que for possível), toda a ajuda é bem-vinda na Quinta da Atalaia. O trabalho é mais que muito – da montagem de estruturas às pinturas, dos acabamentos às arrumações – mas vale a pena. Porque a Festa do Avante! deste ano será, seguramente, a melhor de todas.

O jogo
 
O PS e o PSD – seja através de Sócrates e Passos Coelho, seja por via das respectivas figuras de proa de serviço – inventaram mais um jogo para entreter as massas, agora que se acabou o mundial e as novas sobre o filho de Ronaldo já tresandam a leite azedo. Trata-se do vamos-lá-a-descobrir-quem-é-que-é-mais-neoliberal-ou-defensor-do-estado-social-serás-tu-ou-serei-eu-quem-perder-morreu. Apesar do nome tão pouco apelativo quanto pretensioso (e por isso mesmo não oficial), a verdade é que a iniciativa tem pretensões à internacionalização, aspirando a tornar-se assim numa espécie de jogos sem fronteira da política da direita portuguesa. A primeira fase teve como arena o espaço ibérico, com Sócrates e seus muchachos acantonados em Lisboa num cenário de jornadas parlamentares a que um criativo cheio de humor juntou o slogan «O socialismo democrático e a crise económica e social». Já Passos Coelho – que tirou o jóker no sorteio de posições – viajou até Madrid e tomou de assalto a sede dos populares do país vizinho, com a ingente missão de colar os cacos feitos nas sessões preliminares por Ferreira Leite e mandar mensagens cifradas (mas pouco) à Telefónica, a Bruxelas e ao grupo de Bilderberg (o tal das reuniões secretas, onde só se vai por convite e de que se diz ser o filtro dos futuros dirigentes nacionais e internacionais).
 
Na segunda linha da contenda perfilaram-se personalidades como Francisco Assis e Paula Teixeira da Cruz, Mário Soares e Miguel Macedo, só para citar alguns nomes, tendo cada qual como missão desancar no adversário e somar pontos em juras de fidelidade ao interesse nacional e ao bem-estar do povo, na apresentação de medidas de combate à crise e na garantia de que os sacrifícios serão distribuídos irmamente (no melhor estilo do «vamos rachar no meio: um pra eu, um pra tu, um pra eu... um pra eu, um pra tu, um pra eu... aqui está o meu e aqui está o teu»).
 
 Como seria de esperar, dado o calibre dos jogadores, a coisa terminou num empate, pelo que se aguarda com expectativa as próximas jornadas.
 
 Lamentavelmente – e logo agora que tanto se fala de interactividade – o público não foi chamado a participar, mas apenas a assistir. Valha-nos que alguns indígenas mais expeditos resolveram tomar a iniciativa e contribuir para o jogo lançando grãos de areia na engrenagem a ver no que dá. Uns vieram para a rua subverter as regras, berrando a plenos pulmões que o jogo está viciado; outros deram em catar o bicho à letra das intervenções das equipas para lhes revelar os podres. Os jogadores não gostaram, evidentemente, que o objectivo é distrairem e não serem distraídos. Vai daí, agendaram os próximos lances para Agosto, quando a arraia miúda estiver a banhos na Caparica, e já contrataram dois tinos de rãs, um treinador espanhol, uma bailarina russa, uma banda de rock, três clones do Marcelo e um arrastão em Algés para reescrever o guião e despistar os engraçadinhos. Consta que a Presidência da República vai emitir um comunicado explicando que coordenar jogos é muito difícil, mas não impossível, e que podemos estar descansado que não há qualquer risco de o jogo entre PS e PSD estar descoordenado.
  • Anabela Fino
 

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Sopa e Bolos


«Se não têm pão, que comam bolos!», foi a resposta de Maria Antonieta perante o povo que se manifestava exigindo pão.

Tirando polémicas académicas que existem e têm importância nesse exacto limite, pouca importa se a frase foi de facto pronunciada ou se tendo-o sido o foi com a intenção e o tom que rasgou os timpânos do povo francês. O que é certo é que se passaram mais de dois séculos e a frase persiste na memória colectiva, poderosa ilustração de uma élite indiferente ao sofrimento de que o seu luxo se alimenta, desligada da realidade, convencida da sua natural ou divina superioridade, candidamente capaz de todos os crimes.

É díficil não nos lembrarmos de Maria Antonieta quando ouvimos a ministra da Saúde dessa coisa moribunda, putrefacta e perigosa a que se chama «Governo de Sócrates» recomendar aos portugueses que aproveitem «a contenção que é preciso fazer, para fazerem sopa em casa e não gastarem em fast food».

Porque, como a Rainha de França, a sra. ministra do Governo que corta a direito nas prestações sociais já perdeu a noção que o povo português não precisa de conselhos piadosos sobre o que comer, mas de comida, não precisa de ser obrigado a comer sopa, mas de ser livre de comer o que precisa e quer.

Porque, como a esposa de Luis XVI, a sra. ministra do Governo que rouba nos salários dos trabalhadores para meter no bolso dos banqueiros, acha natural que apenas uma minoria de parasitas possa comer tudo o que quer e que o povo se alimente ou de sopa ou «daquelas porcarias que comem os pobres» nas palavras da Susaninha de Quino.

Porque, como Maria Antonieta, a sra. ministra do Governo que está a destruir o SNS é tão ignorante que nem se apercebe que insulta quando insulta, que mofa quando quer ser séria, que revolta quando quer acalmar.

A sra. ministra e a Coisa de que faz parte estão condenados, a própria burguesia já está a tentar parir os siameses que os substituam. Mas estas declarações ilustram apenas uma situação muito mais grave e profunda, e são o reflexo de uma reconstruída élite que orbita o grande capital monopolista. Torna-se cada dia mais urgente e necessária uma profunda ruptura com a política de direita!

  • Manuel Gouveia

segunda-feira, 5 de julho de 2010




História não acontece

Heródoto descobriu a importância de relatar por escrito acontecimentos que de outro modo se perderiam para sempre. Cinco séculos antes da nossa era, fundou assim uma nova disciplina do conhecimento humano a que chamamos História.

Muitos séculos depois Karl Marx fez uma observação fundamental para a compreensão da História: «A história não faz nada, não luta em nenhuma batalha. Não é a história, mas sim o ser humano vivo e real que tudo faz, tudo possui e luta por tudo. A história – observou - não passa da actividade humana, que visa os seus próprios objectivos».

Isto quer dizer que o mérito de cada tempo é o daqueles que o vivem.

Defrontamos hoje o determinismo de uma autonomeada modernidade que segue o caminho errado de falhadas profecias.

O capitalismo, na sua avidez de lucro, vai matando a sua galinha de ovos de ouro, que hoje não se reduz apenas à exploração da força de trabalho, mas ameaça destruir o próprio mundo.

O perigo a que o sistema capitalista expõe a humanidade nunca foi tão grave, tão vasto, tão... globalizante.

Tão falho de ideias quanto cego de futuro.

Vem isto a propósito da decisão do PCP de apresentar uma candidatura a sério na próxima campanha eleitoral para a Presidência da República.

O PCP tem na sociedade portuguesa um papel específico, insubstituível.

É portador de uma nova concepção para a indispensável reorganização de uma sociedade libertada da carapaça imposta pelo capitalismo.

Nós, comunistas portugueses, somos orgulhosamente os herdeiros das ideias do socialismo, nascidas com o primeiro homem que fez frente à exploração do Homem pelo Homem.

O capitalismo tem imposto ao mundo muitas formas de escravidão. Nós propomos caminhos de libertação do Homem.

É assim que pensamos em cada batalha que travamos.

Assim faremos na batalha eleitoral para a Presidência da República.

A História não acontece. São os homens que a fazem.

Então façamo-la.

Em cada dia, em cada hora, em cada luta que possa ajudar a transformar o mundo.

Rapidamente ou passo a passo, mesmo remando contra a maré.

  • Aurélio Santos

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Merecia mais


Foi pequena, aliás, muito singela, e até contida, a homenagem que durante três dias foi feita a Mário Soares, em Arcos de Valdevez.

Frank Carlucci, ex-director da CIA, amigo de longa data do homenageado, limitou-se a enviar uma mensagem e Gorbachov, último presidente da URSS a quem o imperialismo muito deve, ficou-se pela sempre distante videoconferência. No plano nacional, só a presença do actual primeiro-ministro para uma troca de elogios mútuos conseguiu disfarçar a falta de mobilização das mais altas figuras da nação.

Mário Soares merecia mais. Muito mais. Afinal de contas foi ele que, à frente do PS, deu uma contribuição decisiva para o início e consolidação do processo contra-revolucionário em Portugal. Foi com ele que o PS primeiro vestiu a camisola do «socialismo», para a seguir tirar a máscara, transformando-se num dos principais executantes da política de direita contra a própria Constituição da República. Foi com ele que importantes conquistas de Abril como a Reforma Agrária foram liquidadas. Foi com ele que se deu importantes saltos qualitativos na ofensiva contra os direitos dos trabalhadores, como foi a introdução dos contratos a prazo. Foi com a sua acção e iniciativa que se liquidou parcelas determinantes da nossa soberania, desde logo com a integração do país na então CEE. E é com o apoio dele que, hoje, essa mesma política de abdicação dos interesses nacionais, de agravamento da exploração, de imposição de novos sacrifícios ao nosso povo, prossegue e se aprofunda.

E para que não restem dúvidas, elogiando Sócrates, MS vai pensando no futuro da política (de direita) que ele próprio concretizou e soltando palavras virtuosas para o actual líder do PSD.

Foi por isso muito curta a homenagem prestada a tão exemplar figura do nosso País. Os homens de mão do imperialismo norte-americano deveriam corar de vergonha. Não se pode esquecer um amigo assim. Grupos económicos, alguns deles recompostos depois do 25 de Abril – como é o caso dos Mello ou Espírito Santo – e outros que floresceram nestes mais de trinta anos de política de direita deveriam ter outra atenção para com o «pai da democracia» onde as suas volumosas fortunas florescem na exacta medida em que diminuem as condições de vida do povo português.

  • Vasco Cardoso
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