domingo, 17 de abril de 2011

Os Vampiros


Razão tinha o Zeca Afonso. Se alguém se engana com seu ar sisudo, e lhes franqueia as portas à chegada, eles comem tudo, comem tudo e não deixam nada. O guião que afundou a Grécia e a Irlanda chegou agora a Portugal. A aliança do grande capital financeiro nacional e internacional quer dar o golpe de graça no nosso País, já exangue após 35 anos de políticas ao serviço dos vampiros internos e externos. Aquilo que a União Europeia (presidida por um português...) e o FMI (presidido por um «socialista» francês...) preparam agora para o nosso País não é uma «ajuda». É um novo patamar no processo de esbulho de Portugal e dos portugueses pelo grande capital das grandes potências. É um «abraço mafioso, como podem testemunhar os cidadãos irlandeses e gregos», nas palavras dum ex-economista do Citibank, Michael Burke (The Guardian, 7.4.11). Diz Burke: «As 'ajudas' irlandesa e grega foram apresentadas como um passo extremo, mas necessário, para sustentar a solvência do Estado. Mas fracassaram. Ambas as economias sofreram ulteriores cortes nos ratings das agências de crédito internacionais». Fazendo o paralelo com a série televisiva sobre uma família mafiosa, Os Sopranos, escreve Burke: «A razão pela qual estes enormes montantes de 'ajuda' aumentam a possibilidade de uma falência é porque são ajudas à Tony Soprano – nem um cêntimo irá para os países em questão, indo parar directamente aos seus credores, os bancos europeus e, cada vez mais, os hedge funds dos EUA. Trata-se duma reedição das famigeradas operações de salvação da banca [...]. Os contribuintes das chamadas economias 'periféricas' estão a 'ajudar' os maiores bancos da Europa».

 
Durante décadas venderam ilusões. Foram destruindo a nossa indústria, agricultura, pescas; a nossa cultura, democracia, apoios sociais; a nossa soberania. Diziam que era moderno e inevitável. Mas era tudo mentira. Um colossal e interesseiro embuste.

 
Com as operações de afundamento de sucessivos países da zona euro, os centros de comando da UE pretendem alcançar vários objectivos em simultâneo. O primeiro, como se viu, é o de encher ainda mais as já dilatadas barrigas do grande capital financeiro. O segundo é o de centralizar ainda mais o comando de todo o continente nas mãos do grande capital do centro europeu, que da Líbia à Costa do Marfim mostra cada vez mais as garras do seu passado colonial-imperialista. O terceiro é o de, à pala da crise, desferir um ataque demolidor às conquistas sociais que os trabalhadores e povos da Europa alcançaram após a derrota do nazifascismo e das suas variantes ibéricas ou gregas, enterrando o tão propalado «modelo social europeu» que só existiu porque as classes dirigentes europeias tiveram medo das revoluções socialistas que abalaram o continente no Século XX. Querem criar uma gigantesca reserva de mão-de-obra (ainda mais) barata na sua periferia – à moda das maquiladoras mexicanas na fronteira Sul dos EUA.

 
Alguém acha este cenário impensável? Também aquilo a que hoje assistimos era considerado «impensável», apesar das sucessivas advertências do PCP para o desastre que se estava a consumar. Alguém ainda pensa que não é possível um país da UE «ir ao fundo»? Medite nas palavras de Zeca Afonso: os vampiros trazem no ventre despojos antigos, mas nada os prende às vidas acabadas. No ano passado falou-se na hipótese de excluir a Grécia da zona euro ou até da UE. Hoje, esta perspectiva é apontada para outros. O jornalista da equipa económica da BBC, Paul Mason, escreve (7.4.11): «as duas soluções lógicas e tecnicamente elegantes, são: (i) a periferia abandona a zona euro; (ii) o Norte assume o controlo de todo o sistema». Mas há uma terceira solução. Lógica e politicamente elegante. Os trabalhadores e os povos europeus (do Sul e do Norte) retomarem a bandeira da revolução social. Mostrarem aos mordomos do universo todo, aos senhores à força e mandadores sem lei que o último vinho novo e a última ronda será dançada no pinhal que o povo escolher.
  • Jorge Cadima
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